Quatro autores escreveram a oito mãos o romance Corpos secos. Pronto desde o fim do ano passado, ele já estava previsto para ser publicado neste mês pela editora Alfaguara. Não houve mudança de planos, apesar de a obra de Luisa Geisler, Marcelo Ferroni, Natalia Borges Polesso e Samir Machado de Machado ter sido atropelada pela realidade. A premissa de Corpos secos é uma doença fatal que transforma o Brasil em uma terra pós-apocalíptica.

“Tínhamos pensado em fazer coisas divertidas para divulgar o livro, como mostrar o ciclo de vida dos corpos, a transmissão do surto, mas seria estranho para este momento. Não queríamos ‘causar’ em cima de uma coisa tão séria”, comenta Natalia. Por outro lado, ela diz, o zeitgeist é positivo para o lançamento.

Na narrativa, é o uso de novos agrotóxicos não devidamente testados que detona a epidemia brasileira. O surto teve início no Mato Grosso do Sul, e os infectados passam a não ter mais atividade cerebral. Só que esses zumbis continuam na ativa, ansiando por sangue.

São quatro personagens centrais: Regina, fazendeira no Mato Grosso; Mateus, o paciente zero, que, mesmo infectado, não desenvolveu a doença e passa a ser estudado em São Paulo; Murilo, criança que vive em uma base militar em Santa Maria, Rio Grande do Sul; e Constância, engenheira de alimentos gaúcha que começa a investigar como o surto começou.

Com a população dizimada, os quatro vão se encontrar em Florianópolis, que parece um lugar seguro. “Cada um de nós escreveu um personagem. E cada um deles teve quatro capítulos”, explica Natalia. Os autores só se encontraram pessoalmente uma vez, depois que o livro ficou pronto. Todo o processo foi à distância – Ferroni vive no Rio de Janeiro; os outros, três no Rio Grande do Sul – via teleconferência.

Para Natalia, o que o livro traz em comum com a realidade, além da epidemia, é uma questão mais política. “A história mostra como uma pandemia em um país sem governo pode deixar tudo um caos.” A obra é aberta com uma epígrafe de Incidente em Antares (1971), último romance de Érico Veríssimo (1905-1975).

“É o primeiro livro de zumbi da literatura brasileira. Mas nós não utilizamos nem uma vez a palavra zumbi, mas sim corpos secos, uma definição que veio do Câmara Cascudo (1898-1986)”, diz a escritora.