O Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou o retorno imediato dos empresários Alan Cavalcante do Nascimento, Helder Adriano de Freitas e do ex-deputado estadual João Alberto Paixão Lages ao sistema prisional de Minas Gerais. O ministro Carlos Pires Brandão cassou, nesta terça-feira (7), a decisão que transferiu os três para presídio federal de segurança máxima em Campo Grande, identificando “ilegalidade manifesta” no ato.

O ministro relator concedeu habeas corpus de ofício, sem aguardar o trâmite normal do processo no Tribunal Regional Federal da 6ª Região. A medida foi justificada pela constatação de “constrangimento ilegal que exigia intervenção imediata da Corte Superior”.

A transferência para o Sistema Penitenciário Federal ocorreu em setembro, apenas dois dias após a prisão dos três durante a Operação Rejeito. João Alberto teve a prisão preventiva decretada em 17 de setembro, a autoridade policial representou pela transferência em 18 de setembro, e o Juízo Colegiado determinou a inclusão em presídio federal em 19 de setembro.

O STJ identificou que a mesma fundamentação utilizada para decretar a prisão preventiva foi posteriormente empregada para justificar a transferência ao sistema federal, configurando “verdadeiro bis in idem cautelar”. A decisão original baseou-se no “poderio econômico do grupo investigado”, na “influência sobre órgãos públicos” e em “intimidação a autoridades”.

O tribunal considerou que houve “repetição de fundamentos em decisões quase contemporâneas”, usando o Sistema Penitenciário Federal como “segundo nível de segregação” fundamentado nas mesmas razões da prisão preventiva. Esta prática “desvirtua completamente a finalidade institucional” do sistema federal, que não foi concebido como “agravamento automático da priso preventiva”.

A Lei 11.671/2008 estabelece que a inclusão em estabelecimento penal federal deve ser “excepcional e por prazo determinado”. O ministro Carlos Pires Brandão enfatizou que a legislação não autoriza transferência “fundamentada exclusivamente na gravidade abstrata do delito”, exigindo “demonstração concreta e contemporânea” de que a permanência no sistema estadual representa “risco efetivo e atual”.

A transferência constitui “medida de caráter absolutamente excepcional” que pressupõe “elemento fático superveniente ao encarceramento”. No caso analisado, a “proximidade temporal entre a decretação da priso preventiva e a determinação de transferência” indicou “ausência de fato novo” que justificasse o agravamento do regime.

Manifestação Contrária do MPF

O Ministério Público Federal havia se manifestado contrariamente à transferência quando consultado em primeiro grau, “por entender ausentes os requisitos legais”. O órgão argumentou que os investigados não preenchiam os critérios para inclusão no sistema federal de segurança máxima.

O STJ considerou “particularmente significativo” que o próprio titular da ação penal se opusesse à medida, reforçando a conclusão sobre a inadequação da transferência.

A decisão destacou os prejuízos causados pelo distanciamento geográfico imposto aos presos. A transferência de Minas Gerais para Campo Grande “sacrifica direitos fundamentais” dos custodiados, ocasionando “prejuízos severos ao exercício do direito de defesa”.

Segundo o ministro, o afastamento dificulta “sobremaneira o contato entre o paciente e seus defensores”, comprometendo “o acompanhamento processual” e obstaculizando “a produção de provas defensivas”, e apontou que o distanciamento familiar representa ainda “violação ao princípio da dignidade da pessoa humana”.

Para o STJ, o Decreto 6.877/2009 estabelece critérios objetivos para transferência ao sistema federal, incluindo desempenhar “função de lideranças em organização criminosa”, estar “submetido ao Regime Disciplinar Diferenciado” ou estar “envolvido em incidentes de fuga, violência ou grave indisciplina” no sistema prisional de origem.

Ainda na decisão, Brandão apontou que legislação exige que a medida seja justificada “no interesse da segurança pública ou do próprio preso” e pressupõe que o sistema estadual “comprovadamente não tenha condições de conter” os riscos apresentados. No caso concreto, não houve demonstração de “qualquer fato novo” ou “circunstância posterior à custódia” que revelasse incapacidade do sistema mineiro.

O ministro Carlos Pires Brandão determinou o cumprimento imediato da decisão, com comunicação urgente ao Tribunal Regional Federal da 6ª Região, ao Juízo da 3ª Vara Federal Criminal de Minas Gerais e à direção do estabelecimento prisional federal em Campo Grande.

Os três investigados retornarão ao sistema prisional de Minas Gerais, onde permanecerão “custodiados à disposição do Juízo processante para cumprimento da prisão preventiva”, cujos requisitos “deverão ser continuamente avaliados”. A extensão dos efeitos aos corréus Alan Cavalcante e Helder Adriano foi fundamentada na “identidade de situação fático-processual”.

Operação Rejeito

A Operação Rejeito investiga esquema de corrupção e crimes ambientais envolvendo empresários e o ex-deputado. Segundo as investigações, o grupo desenvolveu sistema de corrupção em órgãos públicos ambientais e minerais através da cooptação de servidores públicos.

A metodologia envolvia identificação de agentes públicos com poder de decisão em órgãos ambientais e oferecimento de vantagens que evoluíam para pagamentos sistemáticos de valores altos. O esquema permitia a liberação de licenças fraudulentas para projetos minerários sem validade legal em áreas sensíveis.

Os projetos minerários ligados ao esquema teriam previsão de lucro superior a 10 bilhões de reais, com potencial dano à União estimado em mais de 18 bilhões de reais. A dimensão econômica da operação foi considerada pela Justiça como fator que potencializa a capacidade de intimidação e corrupção do grupo criminoso.