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Em fevereiro, o órgão emitiu um Alerta Consular sobre o tráfico de pessoas para o Sudeste Asiático a partir de falsas promessas de emprego com salários competitivos (leia texto sobre o alerta). Depois de fazer 200 atendimentos de brasileiros vítimas desse tipo de crime em países diversos em 2023, o órgão lançou, no ano passado, uma cartilha com orientações para quem pretende trabalhar no exterior.
Como nos outros casos detectados pelo governo brasileiro, a história de Daniela Marys começa com uma proposta atrativa de emprego. Em meados de janeiro, ela foi contatada, por meio do aplicativo de mensagens Telegram, para trabalhar na área de telemarketing e tradução no Sudeste Asiático. À época, a belo-horizontina morava em João Pessoa, capital da Paraíba, e estava à procura de emprego. Por isso, decidiu aproveitar a oportunidade no exterior. Ana Flávia conta que a família ficou desconfiada, mas que a arquiteta disse que a empresa era confiável e que teria até feito entrevistas.
A arquiteta foi levada para a cidade de Poipet, a cerca de 400 quilômetros de Phnom Penh, capital do Camboja, e na fronteira com a Tailândia. “Chegando lá, já foi meio esquisito. Ela mandou a localização e foto do quarto. Era como se fosse um galpão no meio do nada, em um bairro afastado”, conta Ana Flávia Pereira. Segundo a esposa da irmã de Daniela, o alojamento tinha várias camas beliche.
GOLPES
No final de fevereiro, Daniela começou o treinamento para o emprego, que supostamente seria para telemarketing e tradução. Foi quando ela descobriu que seu trabalho, na verdade , seria aplicar golpes cibernéticos. “Ela disse: 'isso eu não faço. Vocês não me contrataram para isso'”, conta Ana Flávia. Ainda segundo a cunhada, Daniela teria pedido para voltar ao Brasil e, diante disso, os empregadores retiveram o passaporte dela.
De acordo com Ana Flávia, após os pedidos para voltar ao Brasil, no fim de março, Daniela foi vítima de uma armação e terminou sendo detida por posse de drogas. “Colocaram três pílulas no quarto, que era compartilhado. Quando Daniela chegou, a polícia já estava esperando por ela para levá-la presa por causa dessas três pílulas”, conta a cunhada.
Daniela foi levada para uma prisão na cidade de Sisophon, também no Camboja, onde se encontra até o momento. No começo, a brasileira não conseguiu comunicar à família sobre a detenção, pois teve o celular e o notebook retidos. “Se passaram por ela mandando mensagens para a Lorena, minha esposa, dizendo que se não mandássemos o valor da multa, ela seria vendida para tráfico sexual”, conta Ana Flávia.
Segundo ela, a família estranhou as mensagens recebidas, porque não condiziam com a maneira da arquiteta de se comunicar. Mesmo assim, os parentes ficaram receosos e enviaram cerca de R$ 27 mil ao Camboja. “Como família, você fica com medo. Você não sabe se a próxima foto que você vai receber é da pessoa morta, então você acaba mandando o dinheiro”, diz.
CONDIÇÕES PRECÁRIAS
Na segunda-feira seguinte à prisão, que ocorreu numa quinta-feira, Daniela conseguiu se comunicar com a família por meio do celular de uma policial. Presa há sete meses, ela entra em contato com a família de 10 em 10 dias. As ligações duram poucos minutos. Aos parentes, ela contou que está em uma cela com outras 100 mulheres e que só há um banheiro. “Não tem o mínimo de dignidade humana”, afirma Ana Flávia.
Ainda segundo a cunhada, há cerca de um mês e meio, a arquiteta teve uma infecção, e teria sido levada ao hospital quase duas semanas depois. Daniela também não tem recebido as medicações de que fazia uso contínuo, um ansiolítico e um antidepressivo.
Rede de tráfico
Alerta consular publicado em 14 de fevereiro pelo Ministério das Relações aponta um “aumento significativo” no número de brasleiros vítimas de tráfico de pessoas para exploração no trabalho no Sudeste Asiático. Segundo o alerta, as vítimas são, em sua maioria, jovens com conhecimento de informática, recrutados por “call center” ou empresas de tecnologia na Tailândia, com oferta de salários competitivos, comissões por ativos vendidos e passagens aéreas. Ainda segundo o alerta, da Tailândia as vítimas são levadas de forma irregular para Myanmar, Laos e Camboja, onde são forçadas a realizar fraudes online, como jogos de azar, golpes envolvendo criptomoedas e relacionamentos amorosos falsos para extorsão de outras vítimas. O alerta recomenda que interessados em trabalhar no exterior consultem cartilha produzida pelo Itamaraty em conjunto com o Ministério da Justiça e Segurança Pública cartilha e folheto específico para quem se encontre no Sudeste Asiático.
De acordo com Ana Flávia, para que a arquiteta possa fazer ligações e até receber água e comida, é preciso que a família envie dinheiro. Os parentes têm mandado cerca de US$ 150 dólares a cada 20 dias e estão angustiados. A mãe, Myriam Oliveira, de 66 anos, “está sofrendo muito. O maior desejo da vida dela é que a Daniela esteja de volta”, diz Ana Flávia.
Daniela, por sua vez, está apreensiva e teme ser condenada por um crime que não cometeu, ressalta Ana Flávia. Em 23 de outubro, relata, a belo-horizontina passou por uma audiência, acompanhada de seu advogado cambojano. De acordo a cunhada, a defesa solicitou que o guarda que supostamente encontrou as pílulas no quarto compartilhado em que Daniela estava preste depoimento. Uma nova audiência foi marcada para hoje (12/11).
ASSISTÊNCIA E ALERTAS
Assim que soube da situação, a família entrou em contato com o Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty) e a Polícia Federal, mas se ressente da falta de medidas por parte das autoridades brasileiras, relata Ana Flávia. Ela defende ainda que o governo faça campanhas informativas sobre os riscos “O que a gente espera é que o governo olhe para a Daniela, mas não só para ela (…). Que faça campanhas de conscientização reais, em horário nobre, em todos veículos nacionais, de uma maneira efetiva e prática (...). A gente não quer que mais jovens caiam nessa cilada, ”, defende Ana Flávia.
Ao Estado de Minas, o Itamaraty informou que “por intermédio das Embaixadas do Brasil em Bangkok (na Tailândia) e em Phnom Penh, tem conhecimento do caso, vem realizando gestões junto ao governo cambojano e prestando a assistência consular cabível à nacional brasileira, em conformidade com o Protocolo Operativo Padrão de Atendimento às Vítimas Brasileiras do Tráfico Internacional de Pessoas.” A reportagem questionou a pasta se as embaixadas informaram o motivo da prisão e quais foram as alegações para a detenção de Daniela, mas não obteve retorno.
Sobre as ações informativas, o Ministério das Relações Exteriores destacou que emitiu, em fevereiro, alertas consulares sobre o aliciamento de pessoas para o Sudeste Asiático. Além disso, a pasta ressaltou a existência da cartilha “Orientações para o Trabalho no Exterior”. O guia oferece orientações aos brasileiros que pretendem trabalhar fora do país e tem como objetivos principais alertar sobre riscos como tráfico de pessoas, além de fornecer informações sobre como se planejar, os direitos do trabalhador no exterior e como proceder em situações de emergência.
Segundo Ana Flávia, a família e Daniela têm recebido assistência da Rede Um Grito Pela Vida, iniciativa intercongregacional de enfrentamento e erradicação do tráfico de pessoas, e da “The Exodus Road”, organização sem fins lucrativos que busca combater o tráfico de pessoas. A família da arquiteta criou uma vaquinha online para ajudar a financiar os custos de advogados e as remessas de dinheiro para Daniela.
MORTE NO TRABALHO
Em julho, o mineiro Gabriel Oliveira, de 24 anos, morreu no Camboja, onde estava a trabalho. Ele chegou ao Sudeste Asiático em abril, e foi atraído por uma proposta de emprego. A família dele acredita que o jovem também tenha sido alvo de tráfico de pessoas.
Pai de Gabriel, Daniel Araújo afirma que a família ficou sabendo da morte do filho pela Embaixada na Tailândia e o Ministério das Relações Exteriores e, em seguida, pela empresa em que o filho trabalhava. Segundo ele, a empresa alegou que Gabriel morreu em decorrência de uma explosão na cozinha, mas não teria apresentado provas concretas do acidente.
Mais de quatro meses após a morte de Gabriel, a família segue lutando pela repatriação do corpo dele. Segundo Daniel Araújo a família não tem como arcar com os custos da repatriação, que são de cerca de US$ 15 mil, mais acréscimo de US$ 500 a cada mês após a morte. “Onde o amor reside, o corpo deve descansar”, é o lema defendido por familiares.
AUDIÊNCIA
Diante dos casos de Daniela e Gabriel, foi realizada uma audiência pública na Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) para cobrar “um esforço maior das autoridades brasileiras no apoio aos familiares de dois mineiros vítimas de tráfico humano no Camboja.” A audiência foi requerida pela presidente da comissão, deputada Bella Gonçalves (Psol).
“As famílias não precisam se sentir envergonhadas por pedir ajuda. O Estado brasileiro é que tem culpa por não prevenir e reprimir o assédio a esses jovens, não interromper a ação dessas quadrilhas, e, por fim, no caso do Gabriel, não colocar em prática um decreto de repatriação que já veio tardiamente”, afirma a deputada. Os familiares de ambos os jovens compareceram à audiência.
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Daniela Marys Costa Oliveira, belo-horizontina de 36 anos, está presa no Camboja, Sudeste Asiático, desde o final de março. De acordo com a família dela, Daniela, formada em Arquitetura e Urbanismo, recebeu uma proposta de emprego falsa e foi vítima de tráfico humano. Cunhada da arquiteta, Ana Flávia Pereira conta que a belo-horizontina está detida em uma cela com cerca de 100 mulheres, e que a família está muito abalada. A luta dos familiares pelo retorno da jovem em segurança ocorre quatro meses após a morte do mineiro Gabriel Oliveira, de 24, que também estava no Camboja a trabalho. Os dois casos não são isolados, indica o Ministério das Relações Exteriores.
Em fevereiro, o órgão emitiu um Alerta Consular sobre o tráfico de pessoas para o Sudeste Asiático a partir de falsas promessas de emprego com salários competitivos (leia texto sobre o alerta). Depois de fazer 200 atendimentos de brasileiros vítimas desse tipo de crime em países diversos em 2023, o órgão lançou, no ano passado, uma cartilha com orientações para quem pretende trabalhar no exterior.
Como nos outros casos detectados pelo governo brasileiro, a história de Daniela Marys começa com uma proposta atrativa de emprego. Em meados de janeiro, ela foi contatada, por meio do aplicativo de mensagens Telegram, para trabalhar na área de telemarketing e tradução no Sudeste Asiático. À época, a belo-horizontina morava em João Pessoa, capital da Paraíba, e estava à procura de emprego. Por isso, decidiu aproveitar a oportunidade no exterior. Ana Flávia conta que a família ficou desconfiada, mas que a arquiteta disse que a empresa era confiável e que teria até feito entrevistas.
A arquiteta foi levada para a cidade de Poipet, a cerca de 400 quilômetros de Phnom Penh, capital do Camboja, e na fronteira com a Tailândia. “Chegando lá, já foi meio esquisito. Ela mandou a localização e foto do quarto. Era como se fosse um galpão no meio do nada, em um bairro afastado”, conta Ana Flávia Pereira. Segundo a esposa da irmã de Daniela, o alojamento tinha várias camas beliche.
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Na segunda-feira seguinte à prisão, que ocorreu numa quinta-feira, Daniela conseguiu se comunicar com a família por meio do celular de uma policial. Presa há sete meses, ela entra em contato com a família de 10 em 10 dias. As ligações duram poucos minutos. Aos parentes, ela contou que está em uma cela com outras 100 mulheres e que só há um banheiro. “Não tem o mínimo de dignidade humana”, afirma Ana Flávia.
Ainda segundo a cunhada, há cerca de um mês e meio, a arquiteta teve uma infecção, e teria sido levada ao hospital quase duas semanas depois. Daniela também não tem recebido as medicações de que fazia uso contínuo, um ansiolítico e um antidepressivo.
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Alerta consular publicado em 14 de fevereiro pelo Ministério das Relações aponta um “aumento significativo” no número de brasleiros vítimas de tráfico de pessoas para exploração no trabalho no Sudeste Asiático. Segundo o alerta, as vítimas são, em sua maioria, jovens com conhecimento de informática, recrutados por “call center” ou empresas de tecnologia na Tailândia, com oferta de salários competitivos, comissões por ativos vendidos e passagens aéreas. Ainda segundo o alerta, da Tailândia as vítimas são levadas de forma irregular para Myanmar, Laos e Camboja, onde são forçadas a realizar fraudes online, como jogos de azar, golpes envolvendo criptomoedas e relacionamentos amorosos falsos para extorsão de outras vítimas. O alerta recomenda que interessados em trabalhar no exterior consultem cartilha produzida pelo Itamaraty em conjunto com o Ministério da Justiça e Segurança Pública cartilha e folheto específico para quem se encontre no Sudeste Asiático.
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Em julho, o mineiro Gabriel Oliveira, de 24 anos, morreu no Camboja, onde estava a trabalho. Ele chegou ao Sudeste Asiático em abril, e foi atraído por uma proposta de emprego. A família dele acredita que o jovem também tenha sido alvo de tráfico de pessoas.
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