PORTUGAL
 
Seis jovens brasileiros, vítimas de tráfico humano, foram resgatados pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) em Portugal. Os garotos, ouvidos por servidores do órgão na última quarta-feira (28), foram levados para o país europeu com a garantia de que poderiam atuar como jogadores de futebol na primeira divisão portuguesa. Os meninos haviam sido recrutados em times de base no Brasil. Mas, quando chegaram ao destino, foram abandonados à própria sorte. O governo português concedeu a eles direito de residência no país. O processo corre em segredo de Justiça.


Segundo os fiscais de fronteiras, os jovens brasileiros, cujas idades não foram reveladas, embarcaram para Portugal com a promessa de que seriam remunerados pelos respectivos clubes em que jogariam, mas nada foi cumprido. Além disso, os criminosos ainda exigiram que os familiares dos meninos adiantassem altas quantias para que fossem pagas taxas administrativas em território luso. Esses recursos nunca foram devolvidos. Os garotos estavam em Serpa, na região do Alentejo.


Dados levantados pelo SEF a pedido do Correio apontam que o tráfico de seres humanos em Portugal é uma realidade, e o futebol tem sido usado como instrumento para ludibriar jovens em várias partes do mundo, em especial, do Brasil. Nos últimos cinco anos, foram identificadas mais de 250 vítimas da prática do crime de auxílio à imigração ilegal no âmbito de inquéritos a clubes de futebol. Onzes desses cidadãos, incluindo os seis brasileiros, foram indicados como vítimas de tráfico de pessoas.


Crimes disseminados


O SEF revela, ainda, que, nesses cinco anos, investigou 57 clubes de futebol de Portugal, incluindo as regiões autônomas dos Açores e da Madeira pela suspeita de crimes de auxílio à imigração ilegal e tráfico de seres humanos. Os inquéritos resultaram no indiciamento de 93 suspeitos (11 no último trimestre), dos quais 62 são dirigentes de times, 13 se apresentam como agentes de jovens talentos, 12 são atletas e um, treinador. Dos processos abertos, 39 estão em andamento, sendo que sete começaram neste ano.


Para mostrar como o tráfico de seres humanos por meio do futebol está espalhado por Portugal, cerca de 200 clubes passaram por intensa fiscalização por parte do Serviços Estrangeiros e Fronteiras em cinco anos. Os times estão distribuídos pelos estados (ou distritos, como se fala no país europeu) de Faro, Castelo Branco, Guarda, Viseu, Aveiro, Coimbra, Leiria, Santarém, Bragança, Porto, Braga, Lisboa, Setúbal, Beja e Évora, assim como em Ponta Delgada e na Ilha da Madeira.


“A maioria dos casos identificados pelo SEF nessas ações de fiscalização correspondem a cidadãos estrangeiros que entraram em Portugal ao abrigo da isenção de visto para estadias de curta duração — ou seja, como turistas —, o que não permite o exercício de atividade profissional”, explica o órgão fiscalizador ao Correio. “Note-se que o registo de um jogador estrangeiro na respetiva Associação de Futebol depende da verificação da regularidade da sua situação legal em Portugal, pelo que deve ser titular do Visto de Estada Temporária para exercício de Atividade Desportiva Amadora”, acrescenta.


Conscientização


Para se manter na legalidade em Portugal, os estrangeiros candidatos a jogadores de futebol podem, também, “requerer o Visto de Residência no país de origem, junto da representação diplomática portuguesa (embaixadas ou consulados), ou Autorização de Residência se estiver já em território nacional”. A legislação portuguesa especifica que os cidadãos estrangeiros que entrem ou que permaneçam ilegalmente em território luso é notificado pelo SEF para abandonar voluntariamente o território nacional no prazo que lhe for fixado, entre 10 a 20 dias. Depois disso, o caminho é a deportação.


Diante da gravidade da situação, o SEF informa que vem trabalhado para sensibilizar os clubes de futebol, as associações desportivas e a Federação Portuguesa de Futebol a fim de que não se envolvam nesse tipo de crime. Para isso, tem realizado sessões de esclarecimento relativamente aos procedimentos estabelecidos pela Lei de Estrangeiros em vigor — das quais têm resultado muitas iniciativas de regularização documental.


“Recorde-se que a permanência de cidadão estrangeiro em território português por período superior ao autorizado constitui contraordenação punível com multas, e, no caso em que as fraudes envolverem atividades profissionais, os valores podem passar de 90 mil euros (R$ 495 mil)”, destaca o órgão fiscalizador.