SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A Justiça da Rússia negou nesta terça (18) um recurso apresentado pela defesa do jornalista americano Evan Gerchkovitch para que ele fosse libertado sob fiança da prisão preventiva à qual está sujeito desde março sob acusações de espionagem em solo russo.

Essa foi a primeira vez que Gerchkovitch, repórter do jornal Wall Street Journal, apareceu para o público desde que foi detido. Como é de praxe no país, o jornalista, julgado na capital Moscou, estava dentro de uma espécie de cabine de vidro, onde ficam os réus durante audiências.

A defesa de Gerchkovitch havia solicitado que ele fosse libertado sob fiança de cerca de 50 milhões de rublos (R$ 3 milhões) –montante que seria pago pela Dow Jones, empresa responsável pela publicação do Wall Street Journal–, ou, então, colocado em prisão domiciliar.

Com a negativa do tribunal, o repórter seguirá preso até pelo menos 29 de maio. Tatiana Nozhkina, sua advogada, disse após a audiência que Gerchkovitch seguia resiliente e "pronto para se defender e mostrar que é inocente". A defesa irá recorrer da decisão desta terça-feira.

Além de muitos jornalistas russos ou estrangeiros que, assim como ele, atuam na Rússia, cobrindo em especial a Guerra da Ucrânia, também estava no tribunal a embaixadora dos EUA no país, Lynne Tracy.

Ela disse ser "perturbador ver Gerchkovitch, um jornalista inocente, preso nessas circunstâncias". A diplomata, que esteve com o repórter nesta segunda (17), na primeira visita do tipo desde que ele foi detido, voltou a afirmar que as acusações que pesam contra ele são sem fundamento e que Washington tem pressionado Moscou a libertá-lo.

Gerchkovitch foi detido pelo FSB (Serviço Federal de Segurança) russo em 29 de março em Iekaterinburgo, na divisa entre as porções europeia e asiática do país, acusado de espionagem. Acatadas, as acusações contra ele poderiam levar a uma sentença de 20 anos de prisão.

O repórter do Wall Street Journal é o primeiro jornalista americano detido na Rússia por acusações desse tipo desde o fim da Guerra Fria. Sua detenção gerou uma onda de comoção internacional, com organizações jornalísticas e de direitos humanos –algumas do Brasil, inclusive– pedindo que ele seja colocado em liberdade imediatamente.

 Filho de emigrados da era soviética, Gerchkovitch está na prisão de Lefortovo, antes administrada pela KGB, dissolvida após o fim da União Soviética. O local é tradicionalmente usado para prender acusados de espionagem e outros crimes considerados graves pelo Kremlin.

A audiência desta terça-feira, no entanto, não falou sobre o conteúdo das acusações que pesam contra ele. Em vez disso, o tribunal moscovita julgou apenas se Gerchkovitch deveria ou não estar detido.

A defesa do americano relatou que o repórter, fluente em russo, tem lido na prisão, especialmente literatura do país onde hoje está detido, como "Guerra e Paz", de Liev Tolstói. Os EUA, incluindo o presidente Joe Biden, já condenaram a prisão, caracterizando-a como ilegal.

O americano havia sido credenciado pelo próprio Ministério das Relações Exteriores russo para exercer a profissão no país, seguindo o rito comum para correspondentes estrangeiros. O Serviço Federal de Segurança, porém, agora o acusa de "agir sob instruções do lado americano para coletar informações que constituem um segredo de Estado sobre atividades de um complexo militar-industrial russo".

Moscou, ainda assim, não apresentou provas que sustentem as alegações.

Sua prisão também integra a crescente repressão russa às liberdades de imprensa e de expressão desde o início da Guerra da Ucrânia. Com uma lei de censura à mídia independente, o governo de Vladimir Putin forçou jornalistas a se exilarem para desenvolver seu trabalho.