Le Monde, com tradução de Sylvie Giraud - Com uma canetada, o presidente brasileiro cumpriu sua promessa de campanha mais emblemática, polêmica e ousada, a que poderia fazer do gigante da América Latina um novo "Far-West", onde cada um sairia fazendo justiça e levaria o país a mergulhar na violência e na anarquia. Na terça-feira, 7 de maio, Jair Bolsonaro, que, em 2018, transformara o gesto de uma mão erigida em pistola como símbolo de sua campanha, assinou um decreto facilitando em grande parte o porte de armas.
Agora, os residentes em zonas rurais, bem como vinte profissões como as de políticos, caminhoneiro, policial de trânsito, gerente de clube de tiro e até mesmo alguns jornalistas poderão possuir uma arma de fogo sem ter que demonstrar sua "necessidade absoluta". Espingardas, fuzis e outros revólveres também poderão ser transportados mais facilmente na rua e não mais guardados nos sótãos de casas ou porões de apartamentos. Por fim, medida ainda mais controversa, o Chefe de Estado pretende permitir o transporte de armas em aviões e permitir que crianças e adolescentes frequentem clubes de tiro sem autorização judicial, desde que tenham a aprovação de seus pais.
Após ter assinado o documento, o presidente, ladeado por figuras do lobby de armas, cedeu ao júbilo, deixando escapar: "Estamos no limite da lei." Uma referência ao Estatuto do Desarmamento: a lei do desarmamento de 2003, que este decreto conseguiu distorcer após uma primeira brecha aberta por decreto presidencial anterior, publicado em janeiro.
PERSPECTIVAS ATERRADORAS
Confirmando que governa sozinho e que procura lisonjear apenas seu eleitorado mais radical, o líder da extrema-direita brasileira desprezou o Congresso com a assinatura deste decreto, evitando assim qualquer debate parlamentar, e ignorou as últimas pesquisas que mostravam que a medida é altamente impopular: de acordo com uma pesquisa do Datafolha datada de abril 64% dos brasileiros acreditam que as armas deveriam ser proibidas.
"O primeiro decreto foi irresponsável, o segundo é criminoso", diz Isabel Figueiredo, advogada especializada em segurança pública e membro do Fórum Nacional de Segurança Pública. "Essa medida ignora o consenso científico que estabelece que uma quantidade de armas maior em circulação aumentaria o número de homicídios, especialmente no Brasil, onde os indicadores de criminalidade já são extremamente altos", afirma sem rodeios o Instituto Sou da Paz, que avalia que a medida poderia levar cerca de 19 milhões de pessoas a possuir uma arma.
Mas pouco importa estas perspectivas assustadoras, segundo Jair Bolsonaro, a proteção dos cidadãos não é de responsabilidade do Estado. Em um país onde um assassinato é registrado em média a cada oito minutos, "a segurança pública começa em casa", disse ele.
Além de elevar o número de homicídios, acidentes domésticos e roubo de armas em proveito do crime organizado, a medida poderia, paradoxalmente, reforçar o sentimento de insegurança dos brasileiros, afirma o psicanalista Christian Dunker: "Vários estudos mostraram que a criação de um arsenal de segurança, câmeras, alarmes, etc. reforça a ideia de perigo iminente. Em um nível de criminalidade idêntica, quando a segurança é gerenciada pela comunidade e não pelo indivíduo, esse sentimento não é tão premente. Sempre que você olha para uma arma ou lembra que ela não está longe, você recebe uma mensagem alertando sobre um perigo. Isso pode ser um fator de várias psicopatias: ansiedade, depressão, atos impulsivos."
DECRETO ARBITRÁRIO
Indignada, a oposição pretende cancelar o quanto antes essa medida considerada aberrante tanto na sua substância quanto em sua forma. "Este é um decreto arbitrário que usurpa os poderes do Congresso, único com o poder de aumentar o número de pessoas autorizadas a ter o porte de arma", respondeu o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL, à esquerda), enquanto o Presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, garantiu que já tinha todas as cartas em mãos para revogar o texto. "Nossa assistência técnica já identificou os pontos inconstitucionais do decreto", disse ele.
Segundo opinião de juristas especializados, o decreto viola, em particular, o direito à vida e à dignidade do cidadão, confiando armas a pessoas que não possuem as habilidades necessárias. É também uma violação do direito da criança e do adolescente, que seria exposto e incitado à violência. Sexta-feira, 10 de maio, um parecer do Conselho Geral da Câmara dos Deputados e do Senado já disse que o decreto era "ilegal", enquanto o Supremo Tribunal Federal deu cinco dias para o Presidente apresentar sua argumentação em favor do projeto.