No páreo da eleição mais polarizada da história recente dos Estados Unidos estão a vice-presidente do país, Kamala Harris, e o ex-presidente Donald Trump. Às vésperas da definição do pleito, embora os candidatos apareçam empatados em diversos levantamentos, a democrata e o republicano apresentam diferenças marcantes em relação aos segmentos demográficos: ela lidera entre mulheres, eleitores com formação universitária e minorias étnicas, enquanto ele mantém vantagem entre homens e a população rural.

Os perfis antagônicos são retratos da polarização que afeta não apenas os Estados Unidos, mas surge como uma tendência nas democracias, explica Luciana Mello, professora do Centro Universitário IBMR e especialista em história das relações internacionais e gestão de políticas públicas em gênero e raça. “A polarização política atual, na verdade, não é de agora. (...) É importante olhar e perceber que é um movimento quase global. Existe pouca flexibilidade para ouvir, para ponderar as opiniões e os posicionamentos”, explica.

Kamala, ex-procuradora geral da Califórnia, baseia sua plataforma na exaltação da justiça, defendendo alianças internacionais e sublinhando o papel dos EUA na estabilidade global. Em temas como mudanças climáticas, direitos reprodutivos e políticas migratórias, tem projeções de governo consideradas mais progressistas que as de seu adversário. Trump, por sua vez, prioriza o isolacionismo e a segurança doméstica, prometendo cortar gastos externos e focar a economia interna, mas demonstra uma moral mais “elástica” em relação a regimentos da Constituição do país – ele enfrenta diversas acusações criminais, inclusive pela invasão ao Capitólio, em 6 de janeiro de 2021, executada por eleitores republicanos inflamados por ele.

Mobilização
Nos EUA, onde o voto não é obrigatório, o desafio central para candidatos, historicamente, consiste em mobilizar suas bases. A escolha partidária no país, por sua vez, tende a ser transmitida de pais para filhos, como outras questões culturais, e a participação no pleito é coerente com os valores políticos assimilados na formação dos cidadãos. 

A campanha eleitoral de 2024, no entanto, reflete a ascensão das redes sociais como campos de batalha que moldam percepções políticas em tempo real, principalmente entre as novas gerações, mais propensas a uma decisão individualizada e, portanto, a uma “virada de voto”. Em outras palavras, para os mais jovens, o partido tende a pesar menos que as ideias, efetivamente.

Entretanto, esse cenário é, também, fortemente influenciado pelas fake news. “Nós estamos vivendo, globalmente, um momento da humanidade em que tudo é muito instantâneo e rápido. Para utilizar o conceito do (filósofo Zygmunt) Bauman, são sociedades líquidas. Nessa velocidade, as fake news acabam tendo um espaço para se proliferarem, porque as pessoas, por vezes, não têm mais a paciência de investigar o que estão lendo”, explica a especialista.

Analistas preveem uma disputa apertada, com a alta polarização nas redes sociais alimentando um comparecimento significativo às urnas, com maior engajamento entre latinos e afro-americanos comparado a 2020. Esta eleição, vista como “existencial” pelos americanos, promete definir não apenas a próxima liderança, mas a visão da América que prevalecerá.