As imagens sem precedentes de Donald Trump sentado no tribunal, cercado por policiais de Nova York e acompanhado dos advogados, lançou dúvidas sobre o futuro jurídico e político daquele que foi o homem mais poderoso do mundo. Candidato a um retorno à Casa Branca, o republicano entrou para a  história como o primeiro ex-presidente formalmente acusado pela Justiça: ele responderá por 34 acusações, durante um julgamento que deve começar em janeiro de 2024.

Mas os problemas do bilionário republicano com a Justiça não se resumem à Corte de Manhattan, onde tornou-se réu por falsificar documentos, em um caso associado ao pagamento de suborno à ex-atriz pornô Stormy Daniels, com quem supostamente teve uma relação extraconjugal, em 2016. Trump é suspeito ainda de tentar interferir no resultado das eleições presidenciais na Geórgia. Outros dois casos tumultuam o caminho do magnata rumo ao poder: a retenção ilegal de documentos confidenciais e o seu suposto papel na invasão do Capitólio por apoiadores, em 6 de janeiro de 2021.

Para Anthony Michael Kreis, Ph.D. e professor de direito da Universidade Estadual da Geórgia, é "mais  provável do que nunca" que Trump seja indiciado nos próximos meses, no estado, pela conspiração para cometer fraude eleitoral e por outros crimes ligados à corrupção nas eleições de 2020.

"Ele e associados, que trabalharam para reverter o resultado das eleições presidenciais na Geórgia, também poderiam ser acusados de liderar um empreendimento criminal corrupto para derrubar os resultados das urnas. Isso poderia lhes custar pesadas sentenças", afirmou ao Correio, por e-mail. Kreis assegurou que a quantidade de evidências coletadas na Geórgia é importante, principalmente o telefonema que Trump, então presidente, fez às autoridades eleitorais do estado, no qual exigia votos.

Por sua vez, Clark D. Cummings — professor da cadeira de direito e ética W. Lee Burge da Faculdade de Direito da Universidade Estadual da Geórgia — explicou à reportagem que, caso Trump seja indiciado, ele responderá por quatro acusações.

"A primeira delas é a solicitação de fraude eleitoral em violação do Código Oficial da Geórgia. A segunda, conspiração para cometer fraude eleitoral. A pena para qualquer um desses crimes é de um a 10 anos de prisão", disse. A terceira acusação, segundo ele, envolve fazer uma declaração falsa a uma agência do governo, o que prevê reclusão de um a cinco anos. "Há também a acusação de conspiração para arquivar um documento falso em um registro público, com pena de um a 10 anos." Se considerado culpado, Trump poderá pegar 35 anos de cadeia.

Grampo

A promotora de Atlanta, Fani Willis, indicou que investiga violações dentro da Lei de Organizações Corruptas e Influenciadas por Gângsteres (Rico, pela sigla em inglês). A pena prevista é de cinco a 20 anos. Cummings concorda que a evidência mais sólida de Fani contra Trump é a gravação da ligação telefônica que o então presidente fez para o secretário de Estado da Geórgia, Brad Raffensperger, em 2 de janeiro de 2021. No telefonema, ele o insta a "encontrar 11.780 votos" após um "recálculo". "O acréscimo de 11.780 votos ao número de votos já certificados para o republicano teria dado a ele a vitória por um voto sobre Joe Biden", admitiu. "Isso seria uma evidência de 'solicitação de fraude eleitoral'."

Cummings vê "fortes evidências" nos "certificados eleitorais" criados sob iniciativa da campanha de Trump, em dezembro de 2020, os quais afirmavam, falsamente, que o republicano tinha vencido na Geórgia. "Esses 'certificados de eleitores falsos' foram fabricados em estados-chave e usados por Trump para tentar persuadir o vice, Mike Pence, a impedir o Congresso de declarar Biden o próximo presidente, em 6 de janeiro de 2021."

No ano passado, a pedido de Willis, uma Corte em Atlanta designou 23 cidadãos, para servirem como um "grande júri especial", cuja tarefa será investigar se crimes foram cometidos, na tentativa de interromper as eleições, na Geórgia. Depois de trabalharem por sete meses e de interrogarem 75 testemunhas, os jurados entregaram um relatório à Corte de Atlanta, em 9 de janeiro.

A maior parte do documento permanece secreta, mas se sabe que indiciamentos foram recomendados. Agora, Willis decidirá se vai pedi-los. "Os advogados de Trump temem que o 'grande júri especial' conclua que o magnata  cometeu crimes, pois, recentemente, entraram com um pedido para que o relatório seja destruído e que nenhuma das evidências reunidas seja usada", disse.