De acordo com migrantes, contrabandistas controlam estacionamentos, tráfico de armas e de pessoas que tentam chegar clandestinamente ao Reino Unido.

Por France Presse

G1

Ainda sob o choque dos violentos confrontos da véspera em Calais, que deixaram mais de 20 feridos, imigrantes africanos e afegãos responsabilizaram, na manhã desta sexta-feira (2), os contrabandistas armados, mas também as condições de vida precárias na cidade portuária no norte da França.

"Eu não sou como os contrabandistas: eles são todos loucos e perigosos, como os talibãs do meu país", exclama um afegão hazara de 18 anos que diz se chamar Daniel.

Nesta manhã, a distribuição de café da manhã pela associação de apoio aos imigrantes Salam aconteceu sob uma bandeira com a mensagem "Abram a fronteira" pendurada em um poste.

As dezenas de homens que estavam na fila fazem parte das centenas de imigrantes que vagam pela região, muitas vezes com esperanças frustradas de atravessar clandestinamente para o Reino Unido.

Habib, um etíope de 32 anos, de boné azul, recapitula os eventos da véspera: "Houve uma luta entre os eritreus e os afegãos. Os afegãos atiraram várias vezes, e os eritreus voltaram para se vingar com varas e pedras".

As rixas, recorrentes nesta região, onde imigrantes de diversas regiões se veem forçados a viver lado a lado, foram especialmente violentas nesta quinta-feira: 22 ficaram feridos, quatro deles gravemente, a bala.

Houve "um grau de violência nunca visto", avaliou o ministro francês do Interior, Gérard Collomb.

Migrantes ficam em volta de fogueira para se aquecer em Calais, na França (Foto: PHILIPPE HUGUEN / AFP)

Migrantes ficam em volta de fogueira para se aquecer em Calais, na França (Foto: PHILIPPE HUGUEN / AFP)

Perto da "Big Jungle", o maior dos três acampamentos, onde africanos e afegãos se misturam, Daniel lembra: "As ambulâncias chegaram, a polícia estava desesperada, não sabia o que fazer, as pessoas se agrediam...".

Segundo ele, o que motivou a briga foi que "alguns imigrantes não tinham mais dinheiro, os contrabandistas se enfureceram e atiraram".

Entendimento

O etíope Mohamed, com cerca de 20 anos, explicou que os contrabandistas afegãos "controlam os estacionamentos, fazem tráfico de armas e botam pessoas nos caminhões por 2.500 euros".

Para Loan Torondel, do Albergue dos Imigrantes, os contrabandistas são a origem das rixas: "Eles brigam pelos clientes, pelo acesso aos estacionamentos, em um contexto onde muitas pessoas chegam a Calais após 15 dias".

Ele destaca também as condições de vida precárias dos imigrantes como fonte adicional de tensão. "As condições de vida são terríveis, não há nenhum meio de mediar as adversidades", disse Loan Torondel.

Grupo de migrantes caminha perto de estacionamento em Calais, na França (Foto: PHILIPPE HUGUEN / AFP)

Grupo de migrantes caminha perto de estacionamento em Calais, na França (Foto: PHILIPPE HUGUEN / AFP)

Na manhã de quinta, uma grande operação policial, com 20 veículos, resultou na coleta de tendas e coberturas de equipamentos.

"A única solução que o governo e a polícia encontram é tirar as tendas e impedir as pessoas de dormir", denunciou Jean-Claude Lenoir, presidente da Salam. "Nesta precariedade, evidentemente os contrabandistas não trazem nada de bom".

"A gente às vezes dorme nas tendas", afirma Ahamd, imigrante africano de 17 anos. "Mas a polícia faz de tudo para nos atingir, nos tacam spray nos olhos e pegam nossas coisas", afirmou. As acusações foram negadas pelas autoridades.

Entre 550 pessoas, segundo a Prefeitura, e 800, de acordo com as associações, vivem hoje em Calais, para tentar atravessar para o Reino Unido.

Habib celebra o entendimento alcançado com alguns afegãos: "São amigos, irmãos... Não podemos controlar os contrabandistas, mas nosso objetivo não é criar a guerra. Nós estamos miseráveis".