ATLANTA (Reuters) - Enquanto economistas e investidores vasculham dados sobre inflação, empregos, habitação, bancos e outros indicadores para determinar se os Estados Unidos estão caminhando para uma recessão, uma visita ao maior centro de distribuição de alimentos do país oferece algumas pistas sombrias.

Mais da metade das prateleiras do Atlanta Community Food Bank estão vazias, em parte devido a problemas na cadeia de suprimentos, mas principalmente porque a demanda por assistência alimentar está tão alta quanto durante a pandemia de Covid-19, disseram os executivos da organização sem fins lucrativos, acrescentando que duas em cada cinco pessoas que procuram ajuda alimentar na região de Atlanta neste ano nunca haviam feito isso antes.

"Ninguém antecipou isso", disse Debra Shoaf, diretora financeira da instituição de caridade privada, que depende de doações corporativas e individuais, bem como subsídios do governo, para distribuir alimentos aos famintos em 29 condados da Geórgia.

Shoaf, que também faz parte do comitê de direção financeira da instituição de caridade Feeding America, diz que está ouvindo relatos semelhantes em todo o país. "Estamos de volta aos níveis da pandemia", disse ela.

Em algumas regiões, a demanda está superando até mesmo os dias mais difíceis da pandemia. No centro de Ohio, o banco de alimentos local diz que o número de famílias que procuram ajuda aumentou quase pela metade desde o ano passado.

Mais de 11,4 milhões de domicílios receberam mantimentos gratuitos no início de abril, um aumento de 15% em relação ao ano anterior, segundo dados do censo norte-americano.

"Os bancos de alimentos existem há 50 anos, mas esta é a primeira vez que estamos vendo uma demanda por alimentos sem precedentes combinada com taxas de desemprego historicamente baixas", disse Vince Hall, diretor de relações governamentais da Feeding America, que apoia 60 mil despensas de alimentos.

A demanda sustentada ocorre à medida que grande parte do auxílio emergencial da pandemia se encerra, com destaque para os incrementos temporários ao Programa de Assistência Nutricional Suplementar (SNAP, na sigla em inglês), um programa do governo que fornece cartões de débito para compra de alimentos em lojas.

A inflação também é fator importante: os preços dos alimentos subiram 23% desde março de 2020, quando a pandemia começou, segundo a Secretaria de Estatísticas Trabalhistas dos EUA.

Essa demanda pós-Covid por alimentos gratuitos não é um bom sinal para a economia "e talvez seja um indicador de uma recessão iminente", disse John Lowrey, professor de negócios da Northeastern University, cuja pesquisa se concentra na gestão de bancos de alimentos e saúde pública.

"O fato de termos muitos usuários de primeira viagem que não estão mais preocupados com o estigma de ir a um centro de distribuição de alimentos, e na verdade veem valor nisso, porque não podem mais comprar alimentos no varejo, é um indicador razoável da saúde da economia e dos consumidores", disse Lowrey.

Craig Gundersen, professor de economia da Baylor University e pesquisador da Feeding America, disse que os bancos de alimentos com picos acima dos níveis da pandemia são discrepantes. Não é surpreendente, disse ele, ver um aumento na demanda este ano porque o governo prestou muita assistência durante a pandemia. Ele também observou que os benefícios do Snap, ajustados para cima após uma revisão obrigatória em 2021, permanecem mais altos agora do que há quatro anos.

"Tivemos cheques de estímulo, por muito tempo as pessoas não precisaram pagar seus aluguéis e os benefícios de desemprego eram mais altos do que os salários", disse Gundersen.

Michael McKee, presidente-executivo do Blue Ridge Area Food Bank, que atende a 25 condados na Virgínia, disse que a assistência de emergência da pandemia mascarou a realidade econômica.

De acordo com os números mais recentes disponíveis da Secretaria de Estatísticas Trabalhistas dos EUA, a inflação tem superado os ganhos salariais desde março de 2020.

"O que está acontecendo agora revela a amplitude, escala e difusão da insegurança alimentar neste país e os efeitos da desigualdade, não apenas mais recentemente da inflação, mas da incapacidade dos salários de acompanhar o custo de vida", disse McKee.