A diplomacia brasileira de lacração, para ficar no jargão das redes sociais ao gosto do governo de Jair Bolsonaro (PSL), enfrenta sua maior crise sem ter como se defender: em um fórum estrangeiro no qual não tem assento, a reunião do G7 na França.

Em uma reunião multifacetada, na qual cada país tentará colocar seus problemas à mesa, a questão das queimadas na Amazônia ganhou um inusitado caráter supranacional.

O recuo retórico de Macron nesta sexta (23), quando tentou apresentar sugestões de encaminhamento do caso, também pode indicar uma inflexão da crise —que tem potencial para se tornar uma das maiores que o país já enfrentou na área comercial.

Os problemas anteriores da área externa brasileira foram contornados com a interferência dos militares e do agronegócio, dois esteios ideológicos do governo.

Os riscos de perda de mercado chinês e árabe com as críticas a Pequim e a promessa de mudar a embaixada do Brasil de Tel Aviv para Jerusalém, retrospectivamente, foram afastados a partir de recuos determinados por alertas de negociadores comerciais.

Na Venezuela, o voluntarismo que aproximou o Brasil de uma posição de confronto com a ditadura de Nicolás Maduro no começo deste ano acabou amainado pela pressão militar.

Agora, o agro foi o primeiro a alertar Bolsonaro do risco de sua escalada retórica acerca da Amazônia. Mas os militares cerraram fileiras com o capitão reformado do Exército: todos comungam da ideia de que há um complô estrangeiro para tomar riquezas da Amazônia.

Só que até há pouco os suspeitos de sempre eram ONGs amazônicas mais ou menos insignificantes.

Agora, o presidente da França chama seu colega brasileiro de mentiroso e usa um instrumento de pressão real, a rejeição ao duramente costurado acordo comercial Mercosul-União Europeia.

Aqui há uma confluência de fatores negativos para o Brasil. Além de França e Irlanda admoestarem abertamente Brasília a se comportar na questão ambiental, o tratado precisa da aprovação de todos os Parlamentos envolvidos, dos dois lados do Atlântico.

Basta um país pequeno com um Partido Verde forte no Legislativo para colocar 20 anos de negociações a perder.

Se ainda não é possível dimensionar claramente a crise sem apelar a clichês antibolsonaristas, fica claro que uma linha foi ultrapassada pela união entre radicalismo brasileiro e oportunismo francês.

O impasse poderá se resolver em nome do comércio, é claro, mas dependerá de mais do que acusações mútuas e frases feitas na internet.

Já o desgaste de imagem do país, que já vinha em ritmo acelerado, é um dano sem volta em sociedades liberais mais avançadas, nas quais a temática ambiental sempre ganha colorações dramáticas.

Para este caso específico, a lacração virtual não é resposta eficaz neste momento.