Apesar de recente, a Fórmula-E se consolida como alternativa para companhias que querem atrelar suas marcas ao uso de energia limpa e preocupação com mobilidade


Cidade do México – O uso de energia limpa vem sendo inserido cada vez mais na estratégia de empresas globais e também por startups que perceberam as possibilidades de negócio por trás da substituição do petróleo por fontes alternativas.

O Brasil também tem buscado espaço neste novo momento. Ainda que nas ruas do país, segundo informação do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), existam apenas 300 veículos 100% elétricos em circulação (número de 2018), há quem acredite que vale a pena apostar desde já neste mercado.

Uma dessas vitrines é a ABB FIA Fórmula-E, uma modalidade do automobilismo lançada em 2014, ligada à Federação Internacional de Automobilismo, e que atualmente, de um total de 22 competidores, conta com quatro pilotos brasileiros: Lucas Di Grassi, Felipe Massa, Nelson Piquet Júnior e Felipe Nars. É a nacionalidade com a maior participação.

A modalidade, lançada em 2014, é bem nova em comparação a sessentona Fórmula 1. A velocidade máxima é de 220 km/h, cada competição dura apenas 45 minutos, não é permitida a recarga da bateria e o principal desafio dos pilotos é justamente controlar o consumo de energia para não parar antes de cruzar a linha de chegada.

No lugar do conhecido “ronco dos motores”, o que se houve é um som parecido com o de veículos futuristas como os de filmes como “Blade Runner”, como se os pneus não tocassem o asfalto, apenas flutuassem. Apesar das diferenças em relação à modalidade mais prestigiada do automobilismo, as provas da Fórmula-E têm atraído bom público, equipes, patrocinadores e audiência.

A prioridade são os circuitos de rua, mas algumas etapas, como a que aconteceu na Cidade do México no último sábado, podem ser em autódromos. Para os organizadores, é a forma de tornar a modalidade mais popular. Outra estratégia para esse negócio é criar espaços públicos para os visitantes que não têm como pagar pelo ingresso. Nesses lugares, empresas montam seus estandes e oferecem experiências ligadas a tecnologia, mobilidades e sustentabilidade, como se fosse uma espécie de grande parque de exposição.

BRASIL NOS PLANOS O vencedor no México foi Di Grassi, da equipe Audi Sport Abt Schaeffler, que fez a ultrapassagem decisiva nos últimos segundos da corrida, depois de quase bater no muro de proteção. Perguntado pelo Estado de Minas sobre a possibilidade de o Brasil ser incluído no calendário da Fórmula-E, ele disse de forma entusiasmada que torce para que o país faça parte da competição. “São Paulo, Rio, Brasília, Florianópolis, não importa. Temos quatro pilotos e todos sabem que o brasileiro tem muita paixão pelo automobilismo.”

MINAS NA PISTA
Não foi só no topo do pódio que o Brasil se destacou. A CBMM (Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração), com sede em Araxá (MG), foi a patrocinadora da etapa. A companhia é uma das duas no país que exploram o nióbio. O controle está nas mãos do Grupo Moreira Salles, que tem como sócios um consórcio japonês-sul-coreano e um grupo de empresas chinesas.

Gerente geral da divisão de mobilidade da companhia, Rodrigo Amado conta que neste ano a CBMM decidiu ser patrocinadora de duas etapas e copatrocinadora de uma terceira, em Cingapura, onde participará de rodadas de discussão sobre formas de melhorar a mobilidade das cidades.

Segundo o executivo, a decisão de incluir o Brasil entre as etapas da competição depende de negociações entre a FIA e o poder público – no caso, os prefeitos. Algumas cidades brasileiras já teriam sido sondadas, mas Amado desconversa sobre possíveis destinos. Apesar de ainda não haver uma definição sobre o país fazer parte da Fórmula-E em 2020, a CBMM já tem uma carta de intenção assinada para ser patrocinadora.

Estar em uma competição como essa, explica o gerente da CBMM, é uma forma de divulgar os usos do nióbio e desenvolver parcerias com outras empresas. Hoje, 95% da sua produção é exportada. No Brasil, seus clientes estão na área de siderurgia.

Nesta temporada, a suíça ABB, especializada em tecnologias de automação e de energia, é a principal patrocinadora, dá nome ao evento e tem seus carregadores elétricos usados por todas as equipes. Para Greg Scheu, presidente da ABB Américas, apesar de os veículos elétricos ainda serem pouco representativos em relação aos que utilizam energia fóssil, o espaço para crescer será muito grande, inclusive no Brasil.

Scheu acredita que a tendência seja que expansão gradativa em diferentes frentes: transporte público, táxis e veículos de uso pessoal. Para a ABB, pode vir daí uma boa fonte de receita. A companhia detém a tecnologia de produção de equipamentos para recarga rápida e já está presente em algumas eletrovias no Brasil. Entre elas, a BR-277, rodovia federal que corta o estado do Paraná e une Paranaguá a Foz do Iguaçu. É possível abastecer em oito minutos e rodar até 200 quilômetros. O executivo torce pela inclusão do país na próxima temporada e espera que o Rio de Janeiro seja o destino. “Adoraria que fosse no Rio, perto da praia.”

Além dessas empresas, a Fórmula-E tem hoje entre seus apoiadores nomes que já tem tradição no automobilismo, como Tag Heuer e Allianz, mas também atraiu outras companhias ligadas ao setor de energia, engenharia e mineração, como a Enel, Bosch e a Antofagasta Minerals.

Para o piloto Di Grassi, a evolução desse tipo de tecnologia será cada vez mais veloz. “A tecnologia desenvolvida na Fórmula-E evolui muito rapidamente e poderá trazer muitos benefícios tanto no que diz respeito a emissão de poluentes quanto na redução de ruído. São várias vantagens quando se faz a conta. Estamos em um momento único de transformação e acredito que os carros elétricos vão ficar por muito tempo”, avalia.

*A jornalista viajou a convite da ABB Brasil

“A popularização virá com o tempo”, diz piloto

A eletricidade também é a matriz energética da Jaguar Ipace Ethrophy, um evento com carros de turismo que dá suporte à Fórmula-E e também conta com pilotos brasileiros, Miguel Jimenez e Cacá Bueno. Na etapa da Cidade do México, Jimenez terminou a competição em terceiro lugar. Entre seus patrocinadores está a Zeg, companhia do segmento de energias renováveis.

Jimenez conta que apresentou o projeto aos executivos da Zeg e o interesse foi imediato. “Tem todo sentido com tudo que eles estão desenvolvendo na área de energias renováveis. O carro elétrico é o que emite menos poluição”.

Para o piloto, a proposta de unir uma marca a um projeto de energia limpa não é o único apelo para patrocinadores que se interessam por modalidades como a Fórmula-E e a Jaguar Ipace Ethrophy. As discussões sobre formas de buscar alternativas nesses eventos esportivos também são importantes. “O esporte chama a atenção para o que pode ser feito para ajudar o mundo. A Fórmula E foi criada para isso e está fazendo o trabalho dela. O motorsport, por sua vez, acelera a evolução dos carros. Essa é uma combinação importante”, analisa.

Jimenez não acredita que as competições com motores elétricos tenham pouco apelo em relação aos motores a combustão. Para ele, a popularização virá com o tempo. “As corridas são muito boas e o público quer esse tipo de emoção. Mas, por outro lado, não acho que as corridas a combustão vão acabar, mas se adaptar a um híbrido.