Lisboa — Em apenas 48 horas, os brasileiros que vivem em Portugal esgotaram todas as vagas disponibilizadas pelo governo até o fim deste ano para a renovação de autorizações de residência no país. Com a extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) no último domingo (29/10), esse serviço passou a ser prestado pelo Instituto dos Registros e do Notariado (IRN), correspondentes aos cartórios no Brasil. Mesmo nos locais menores, onde a presença de brasileiros não é tão massiva, não há mais vagas de atendimento até o fim de dezembro. A gritaria entre quem ficou de fora é geral.

 

Havia uma grande expectativa de que, com a extinção do SEF e a criação da Agência para Integração, Migrações e Asilo (Aima) para substituí-lo, os serviços aos imigrantes fossem melhorar. Mas o que se vê, três dias depois da entrada em operação a agência, é que tudo continua como sempre foi, ou seja, um descaso total com os cidadãos que escolheram Portugal para trabalhar e morar. Com a entrada em vigor da Aima, os serviços de renovação de autorizações de residência passaram a ser prestados pelo IRN. Há 347 mil processos pendentes, mais da metade envolvendo brasileiros.

Especializado em imigração, o advogado Bruno Gutman, brasileiro com cidadania portuguesa, vive, em casa, o drama da falta de estrutura do governo português para atender os estrangeiros. Desde segunda-feira (30/10), quando a Aima passou a operar e o IRN foi escalado para atender os imigrantes, ele vem tentando vagas para a renovação dos documentos da mulher dele, das duas filhas e da sogra. As autorizações de residência estão vencidas e elas precisam atualizá-las, de forma a se sentirem seguras no país europeu. Estrangeiros sem a documentação adequada enfrentam dificuldades até para acessar a rede pública de saúde.

“É incrível que isso esteja acontecendo. Há pelo menos um ano, sabe-se da extinção do SEF. É incrível que o governo não tenha preparado a infraestrutura adequada para corresponder às expectativas dos cidadãos”, diz Gutman. Ele acredita que, dado o tamanho da demanda represada, mesmo que a nova agência reforçasse o número de servidores e trabalhasse dia e noite, não daria conta de atender todos os que estão na fila de espera. Nem a tecnologia tem ajudado no processo, pois, apesar de os pedidos de renovação serem feitos on-line ou por aplicativo do Siga, o sistema de agendamento dos serviços públicos do governo, poucos conseguiram acessar os sistemas. Mais: o site da Aima ainda não contempla o agendamento.

Ajuda da Assembleia da República

Na tentativa de minimizar os constrangimentos aos imigrantes que desejam regularizar a situação documental em Portugal, Gutman procurou alguns deputados com a proposta de que apresentem, o mais rapidamente possível, um projeto à Assembleia da República para estender o prazo de validade das autorizações de residência vencidas. No ano passado, ciente das dificuldades do agora extinto SEF em atender a demanda, o governo baixou um decreto prorrogando, até o fim deste ano, todos os documentos vencidos. No entender do advogado, seria importante o Parlamento estender esse prazo para, pelo menos, até o meio de 2024.

“Nas conversas que tive com os parlamentares, eles se mostraram muito preocupados com as dificuldades operacionais da Aima e do IRN e prometeram levar o tema a debate”, conta Gutman. Dentro do governo também há sensibilidade em relação ao assunto. Responsável pela nova agência, a ministra adjunta de Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes, afirma que está sendo montada uma megaoperação para o primeiro trimestre de 2024, a fim de reduzir as pendências com os imigrantes. A prioridade de atendimento será para aqueles que pleiteiam o reagrupamento familiar, quando um cidadão já tem autorização de residência em Portugal e quer estender o benefício a familiares.

A ministra sabe que precisa correr com isso e diminuir ao máximo o estoque de 347 mil processos pendentes, pois, a partir de março, começará o processo de renovação das autorizações de residência concedidas por meio de um acordo entre os países da Comunidade de Língua Portuguesa (CPLP). Pelo menos 150 mil pessoas estão nessa condição, a maioria, brasileiros. A renovação desses documentos é obrigatória quando completado um ano de vigência.

Depois, a atualização será feita após dois anos. Esses documentos, por final, vêm sendo questionados pela Comissão Europeia, por não se enquadrarem às regras definidas pelo bloco de 27 países. Portugal tem dois meses para responder à Comissão, a contar do início de outubro. No total, mais de 1 milhão de estrangeiros vivem em Portugal, sendo que ao menos 400 mil são brasileiros.

 

Fonte:correiobraziliense.com.br