Brasil de Fato - Jean-Luc Mélenchon, líder do partido de esquerda A França Insubmissa (LFI), principal agremiação da coalizão vencedora das eleições parlamentares francesas deste ano, a Nova Frente Popular (NFP), disse que o presidente francês Emmanuel Macron "negou a democracia" ao nomear o político de direita Michel Barnier como primeiro-ministro do país e que "a eleição foi roubada do povo francês".
“O presidente acaba de decidir negar oficialmente os resultados das eleições legislativas que ele próprio convocou”, disse Mélenchon num discurso transmitido ao vivo após o anúncio. “A Nova Frente Popular, que ficou em primeiro lugar nas eleições, não ocupará o posto de primeiro-ministro e a responsabilidade de se apresentar aos deputados. Portanto, a eleição foi roubada do povo francês. A mensagem foi negada”, afirmou.
Na quarta-feira, a LFI apresentou uma proposta de destituição de Macron, pela recusa em nomear como primeira-ministra Lucie Castets, candidata da NFP, e convocou uma grande manifestação para o próximo sábado (7).
"Apresentamos a proposta de resolução para destituir o presidente da República", anunciou o grupo parlamentar da LFI, maior força dentro da NFP, revelando que a proposta conta com "81 assinaturas [de deputados] de três grupos parlamentares, mais de 212 mil assinaturas populares da petição online".
Durante todo o processo de negociação para a formação do novo governo, Macron buscou isolar a LFI que acusa o mandatário de "golpe". Na última semana, o presidente rejeitou nomear como primeira-ministra a candidata de esquerda em nome da "estabilidade institucional". Ele convocou uma nova rodada de consultas com partidos e "personalidades" para superar o impasse político em que o país se encontra.
Guinada à direita
Em um comunicado divulgado nesta quinta-feira (5), a Presidência francesa anunciou que Macron solicitou a Barnier a "formação de um governo de unidade", após semanas de consultas "sem precedentes." "O presidente garantiu que o primeiro-ministro e o próximo governo reunissem as condições para que sejam os mais estáveis quanto possível" e para que tenham o maior apoio possível no Parlamento, afirma o comunicado.
"Serão necessários muita escuta e muito respeito. Respeito entre o governo e o Parlamento, entre todas as forças políticas [...]. Eu começarei a trabalhar nisso a partir desta noite", disse Barnier em suas primeiras declarações como primeiro-ministro.
Após seu breve retorno à política francesa em 2021 para disputar sem sucesso as primárias do LR para as eleições presidenciais de 2022, Barnier defendeu especialmente uma "moratória" sobre a imigração.
Aos 73 anos, Barnier, que foi ministro em diversas ocasiões, comissário europeu e negociador-chefe do Brexit - que determinou a saída do Reino Unido da União Europeia - pode contar com o apoio de seu partido, Os Republicanos (LR), e da aliança de centro-direita de Macron.
Mas isto seria insuficiente diante de uma possível moção de censura, caso tanto o partido de extrema direita Reagrupamento Nacional (RN) e seus aliados como a coalizão de esquerda votassem contra Barnier. Os dois blocos juntos totalizariam 335 votos, muito acima dos 289 necessários.
O partido de extrema direita de Marine Le Pen afirmou que aguardará o discurso de Barnier antes de decidir sobre a sua eventual censura. As condições antecipadas pelo RN são uma reforma do sistema eleitoral e novas legislativas em 2025.
Uma queda rápida de Barnier seria um revés para Macron, que justificou as longas consultas para formar um governo com a busca da "estabilidade institucional", quase dois meses depois do bloqueio político provocado pelas eleições legislativas.
O presidente provocou uma crise política na França ao antecipar para junho as eleições legislativas que estavam previstas para 2027. A votação deixou a Assembleia Nacional (Câmara Baixa) com três principais blocos, todos distantes da maioria absoluta.
Para demonstrar a complexidade da situação, o governo do primeiro-ministro Gabriel Attal, que Macron pediu para continuar à frente do gabinete durante os Jogos Olímpicos de Paris-2024, está no poder há 51 dias de maneira interina, um recorde na França desde o final da Segunda Guerra Mundial.
Na França, o primeiro-ministro é nomeado pelo presidente e não precisa ser confirmado no Parlamento. Mas o tempo era curto para Macron, porque o futuro governo deve apresentar os seus orçamentos para 2025 até 1º de outubro, em um contexto de aumento do déficit.
O novo primeiro-ministro deve confirmar se seguirá a recomendação do ministro da Economia em exercício, Bruno Le Maire, de fazer cortes de 16 bilhões de euros (R$ 99 bilhões). O desejo de Macron de manter a reforma da Previdência que impôs por decreto em 2023, e que a NFP prometeu revogar, também pesou na escolha de seu primeiro-ministro.