Thereza Nardelli foi surpreendida pelo sucesso da postagem, que viralizou após a eleição de Jair Bolsonaro, no último domingo (28). 'A imagem e a própria mensagem já me transcenderam', afirma

Thereza se dedica à técnica handpoke de tatuagens (foto: acervo pessoal)
Ninguém solta a mão de ninguém. A frase viralizou nas redes sociais no último domingo (28), após a vitória de Jair Bolsonaro (PSL) à Presidência da República. A arte que acompanha o enunciado é de autoria da tatuadora mineira Thereza Nardelli, de 30 anos, que foi pega de surpresa pelo sucesso da publicação.
A imagem foi criada há alguns meses e replicada por Thereza no dia da eleição.“Tinha postado às cinco da tarde e, aos poucos, os amigos foram me mostrando que havia muita gente compartilhando”, conta, em entrevista ao Portal Uai. “Foi muito impactante. No início, fiquei um pouco aérea, não acreditei na dimensão que havia alcançado. A ficha só caiu quando vi que tinha chegado na Bruna Marquezine”, conta.


Além da atriz, a criação foi compartilhada por outros famosos, como Bruno Gagliasso, Maria Rita e Pabllo Vittar. A vereadora Áurea Carolina (PSOL), eleita agora deputada federal, também postou a imagem em suas redes sociais. Em pouco tempo, o trabalho de Thereza se tornou símbolo de resistência dos opositores ao candidato eleito – dado o discurso controverso de Bolsonaro envolvendo minorias.


“Eu e meus amigos, que têm o mesmo posicionamento, sentimos um completo mal-estar após o resultado. Mas a própria militância (a favor do candidato Fernando Haddad, do PT), no segundo turno, ensinou muito às pessoas e foi bonito ver tanta gente contra o fascismo e o discurso de ódio. Não tenho o sentimento de derrota, mas, sim, a necessidade de resistir ao lado de quem também quer preservar a vida e a dignidade, independentemente da origem étnica, da orientação sexual ou do gênero”, afirma Thereza.

MÃE A inspiração para esse trabalho de sucesso veio após uma conversa com sua mãe, Leda Maria. “A arte foi feita há alguns meses, quando vivi uma situação pessoal muito difícil, em que eu e minha mãe precisávamos de ajuda. Foi aí que ela me disse a frase, para que ficássemos sempre juntas”, revela.


A relação com a mãe é constante referência para seu trabalho. “Ela é meu exemplo mór de mulher. Criou minha irmã e a mim praticamente sozinha, fazendo os 'corres' dela para conseguir pagar as contas. Sempre foi feminista, mesmo sem usar essa palavra ou se declarar assim. Nossa história é de militância. Pequenininha, fui com ela às passeatas contra o Collor (presidente afastado do cargo por impeachment, em 1992), e comemorei quando Lula foi eleito (em 2002)”, lembra Thereza.

Ela conta que a procura por seu trabalho se intensificou nos últimos dias. “Tenho recebido bastante e-mail e o inbox do Instagram eu já nem consigo ler mais. Também estou recebendo mensagens muito legais, de gente que se sentiu acolhida, dizendo que foi muito importante ter visto a imagem.”


“Simplesmente aconteceu de a imagem estar lá em um momento extremamente sensível para o país. Gostaram da imagem pelo mesmo motivo que a frase da minha mãe me confortou naquela época. É uma mensagem forte, ao mesmo tempo que não é agressiva, nem condescendente”, diz.

HANDPOKE Formada em Ciências Sociais, com mestrado em comunicação social, Thereza conta que o desejo de desenhar vem desde a infância. “Comecei estragando as canetinhas do meu pai, que é publicitário. Minha avó já tinha esse desejo de desenhar e transferiu para mim. Pagava cursos e me incentivava muito. Após o fim do mestrado, voltei a desenhar, porque é um trabalho que me permite dar vazão a vários sentimentos.”


Atualmente, ela trabalha como tatuadora no Estúdio Pietá e mantém o projeto individual Zangadas, em que se dedica à técnica handpoke. As tatuagens são feitas manualmente, sem máquina, com um risco que remete à estética punk e underground.


Thereza não pensa em lucrar diante de tantas reproduções da frase Ninguém solta a mão de ninguém. Ao contrário, liberou a imagem de sua autoria, em alta resolução, para que tivesse uso livre. “Apenas sugeri que possíveis lucros fossem doados para mulheres em situação de vulnerabilidade”, conta.


“Esse trabalho cresceu e se tornou muito maior que eu. As pessoas se apropriaram e deram um sentido muito mais amplo àquilo que foi criado a partir de um sentimento pessoal. A imagem e a própria mensagem já me transcenderam”, conclui Thereza.