Fotógrafo e artista plástico responsável pelas icônicas capas do movimento musical, Cafi morre no Rio, aos 68 anos

Pernambucano de Recife, Carlos da Silva Assunção Filho entrou para a história da música mineira. Conhecido como Cafi, ele foi o fotógrafo oficial do Clube da Esquina e autor da famosa capa do disco duplo que Milton Nascimento e Lô Borges lançaram em 1972, que traz a imagem de um menino negro e um menino branco sentados perto de uma cerca.

Cafi faleceu na madrugada desta terça-feira (1), aos 68 anos, após sofrer um infarto durante a virada de ano no Arpoador, no Rio. Ele foi levado ao hospital Miguel Couto, mas não resistiu. O fotógrafo deixa os filhos Miguel, Clara e Joana e três netos, Theo, Alice e Julien. Cafi teve um relacionamento com a coreógrafa Deborah Colker, mãe de Miguel e Clara.

Nas redes sociais, Alceu Valença prestou sua homenagem. “Ao meu amigo Cafi, com tristeza pela partida precoce. Amor e força para a família e aos amigos e amigas. São muitos”, escreveu o cantor pernambucano, que compartilhou a foto da capa do disco “Cinco Sentidos” (1981), feita por Cafi. Valença já tinha citado Cafi na música “Leque Moleque”, parceria com Carlos Fernando.

Ana de Hollanda, ministra da Cultura no governo de Dilma Rousseff e irmã de Chico Buarque e Miúcha, também lamentou a perda do amigo. “Cafi, meu querido, até você nos deixou?”, escreveu. No Instagram, o cantor e compositor Beto Guedes também dedicou palavras ao amigo. “Perda irreparável no primeiro dia do ano! Nos deixou hoje o querido Cafi, que acompanhou e registrou em fotos e capas belíssimas toda a trajetória do Clube da Esquina. Vai em paz, mestre das imagens que até hoje nos emocionam!”, publicou.

Lô Borges usou a mesma rede social para se despedir. “Hoje perdemos um grande artista, fotógrafo, poeta visual e, acima de tudo, um grande amigo. Das mais de 300 capas de discos da música brasileira, Cafi realizou várias icônicas, entre elas as dos álbuns ‘Clube da Esquina’ e do ‘Disco do Tênis’, que sou eternamente grato. Descanse em paz, meu amigo”, postou Borges.

O encontro de Cafi com as Minas teve o seu capítulo mais marcante em 1972. Amigo de Ronaldo Bastos – letrista de “Fé Cega, Faca Amolada” e “Cravo e Canela” e “Nada Será como Antes” –, o fotógrafo foi convidado a produzir a capa do Clube da Esquina”, de Milton Nascimento e Lô. Ainda sem saber qual seria o título do disco, ele realizou uma série de fotografias a pedido de Bituca.

Mas foi quando voltava de uma chácara em Nova Friburgo (RJ) no carro de Bastos que, ao avistar dois meninos sentados na beira da estrada, realizou o clique pelo qual seria lembrado pelo resto da vida. As imagens do Clube da Esquina teriam, a partir dali, a marca do olhar de Cafi. “Para mim, esse disco tinha uma característica que fazia contraponto ao preciosismo plástico, uma coisa de morosidade, de encontro de mineiros com cariocas. Tinha uma relação de Milton com Lô na capa, mas nem era essa a intenção. Era mesmo uma coisa de arame farpado, de estrada, de mineiridade”, declarou Cafi em entrevista ao site do Museu do Clube da Esquina.

Travessia

Nascido em Recife em 1950, Cafi estudou gravura e pintura na Escolinha de Arte do Brasil. Após se mudar para o Rio, ainda na adolescência, começou a pintar cenas do Nordeste. O interesse pela fotografia surgiu após receber de presente das irmãs uma câmera, para que fotografasse seus quadros. Cafi também foi um dos fundadores do coletivo Nuvem Cigana, que renovou a poesia nos anos 1970. Além disso, foi parte importante da história do Circo Voador, com participação no jornal “Expresso Voador” e como fundador da galeria de artes do circo.

Autor de mais de 300 capas de disco, é ele o responsável pelas imagens que ilustram “Geraes” (1976), “Minas” (1975) e “Milagre dos Peixes” (1973), de Milton; do famoso “Disco do Tênis” (1972), de Lô Borges, cujo batismo original trazia apenas a assinatura do cantor; “Sol de Primavera” (1979), “Amor de Índio” (1978) e “A Página do Relâmpago Elétrico” (1977), de Beto Guedes; e diversos outros trabalhos que envolveram Chico Buarque, Nana Caymmi, Alceu Valença, Edu Lobo, Geraldo Azevedo e Jards Macalé.

Atualmente, Cafi trabalhava em parceria com o fotógrafo Léo Aversa na capa do próximo disco de Macalé, previsto para ser lançado nesse mês de janeiro. A obra do fotógrafo também é tema do documentário inédito “Salve o Prazer”, de Lírio Ferreira, com roteiro do próprio Cafi. Entre os últimos trabalhos dele está o ensaio “Religiosidade Profana no Asfalto do Rio de Janeiro”, com imagens do Carnaval de rua. (Com agências)