"Um ponto de inflexão": a histórica interrupção na terça-feira (8) da partida da Liga dos Campeões entre Paris SG e Basaksehir de Istambul, após as palavras racistas do quarto árbitro, recebeu apoio unânime do mundo do esporte, que espera que a reação represente uma mudança para eliminar o racismo dos estádios.

O confronto válido pela 6ª rodada do grupo H da Liga dos Campeões será disputado nesta quarta-feira, a partir do momento em que foi interrompido na véspera, aos 14 minutos do primeiro tempo. Não contará com a equipe de arbitragem romena que estava em campo na terça-feira, em uma partida que ganhou valor simbólico.


Ouvir o quarto árbitro Sebastian Coltescu designar o treinador assistente Pierre Achille Webó como "o negro" em romeno ("negru") provocou a revolta dos jogadores e da comissão técnica do time turco, e depois do PSG, que concordaram em abandonar o gramado após alguns minutos de conversas tensas. 


Algo do tipo nunca havia sido registrado no mundo do futebol, muitas vezes considerado relapso a respeito do tema.


"Um gesto de dimensão sem precedentes e de um impacto incrível", afirma o jornal esportivo francês L'Equipe. "Os jogadores disseram basta!", destaca Le Parisien.


"Demos uma lição no árbitro racista", comenta o jornal turco Hurriyet. Ainda na terça-feira, o presidente turco, Recep Tayyip Erdohan, condenou o incidente.


Na Espanha, o jogo PSG-Basaksehir ofuscou o reencontro entre os astros Lionel Messi e Cristiano Ronaldo na capa do jornal As: "Stop ao racismo".


Para o italiano Gazzetta dello Sport "aconteceu algo inédito e sobretudo muito grave".


Um evento "estranho e particularmente surpreendente que pode ser um ponto de inflexão na luta contra a discriminação no futebol", afirma o britânico The Guardian. 


Indignação de Webó


A opinião é compartilhada pelo ex-jogador inglês Rio Ferdinand, cujo irmão Anton recebeu insultos racistas em 2011: "Os organismos deste esporte devem se posicionar de maneira forte. (Ver) os jogadores abandonando juntos o campo é um passo no bom caminho, mas não se pode deixar para os jogadores a responsabilidade de fazer isto".


Neymar, Kylian Mbappé e outros atletas do PSG expressaram nas redes sociais o compromisso contra o racismo.


O ministro dos Esportes da Romênia, Ionut Stroea, pediu desculpas "em nome do esporte romeno".


Bastaram poucos segundos, no estádio Parque dos Príncipes sem torcedores, para a explosão da polêmica.


Depois de ouvir como foi chamado pelo árbitro, Pierre Achille Webó expressou sua indignação: "He said 'negro' (Ele disse 'negro')". 


As explicações de Sebastian Coltescu ("'negru' quer dizer negro" em romeno, palavras captadas pelo canal RMC Sport) não acalmaram os integrantes do clube turco. 


Um membro da comissão técnica do Basaksehir respondeu: "Estamos na Liga dos Campeões, não na Romênia".


Investigação e novo árbitro


O jogador senegalês Demba Ba pediu explicações ao quarto árbitro: "Por que na hora de falar de um cara branco você diz 'esse cara', e na hora de falar de um cara negro você diz 'esse cara negro'?", perguntou em inglês o atleta do Basaksehir. 


Em seguida, Mbappé afirmou que não continuaria jogando, se Coltescu permanecesse no gramado.


"Não aceitamos. Você é racista", disse o técnico do Basaksehir, Okan Buruk, ao quarto árbitro.


Depois de 10 minutos de discussões, os jogadores seguiram para os vestiários. Duas horas mais tarde, a Uefa anunciou oficialmente o adiamento do jogo.


A entidade anunciou uma "investigação profunda" sobre o tema. O código disciplinar prevê suspensão de pelo menos 10 partidas por comportamento racista, ou discriminatório.


O veterano holandês Danny Makkiele será o árbitro dos 76 minutos restantes de uma partida (0-0), cujo interesse esportivo passou para o segundo plano.


O PSG se classificou para as oitavas de final, graças à vitória do RB Leipzig sobre o Manchester United (3-2). O clube precisa da vitória contra o Basaksehir para terminar como líder da chave.


A partida será recordada em um ano marcado pelo crescente compromisso ativista do mundo do esporte, especialmente no futebol, onde até agora a Uefa desejava manter a política o mais longe possível dos estádios.


A indignação de muitos atletas americanos contra a injustiça racial, dentro do movimento Black Lives Matter, provocou ações do outro lado do Atlântico.