Mesmo aposentada, dona Maria segue ensinando estudantes a ler e a escrever; com meditação, outra educadora afirma ter reduzido violência entre alunos

Há mais de 40 anos, Maria Antônia das Graças, 63, queria ser contadora. Mas atendendo o desejo da mãe, ela fez magistério e tornou-se professora. “Hoje, não consigo me imaginar em outro lugar que não seja ensinado. Não me arrependo de forma alguma”, diz dona Maria, como é conhecida no bairro Jardim Canadá, em Nova Lima, na região metropolitana da capital, onde tornou-se a primeira educadora e nesta segunda-feira (15) comemora mais um Dia dos Professores.

Há 15 anos, dona Maria aposentou-se. Mas o prazer de ensinar a manteve em sala de aula e com o mesmo pique de quando iniciou a carreira, mesmo tendo que estudar para o curso de pedagogia, no qual ela pretende se formar no ano que vem. Não bastasse isso, ela ainda dá aulas em uma ONG e, nas horas vagas, leciona na varanda da própria casa.

“Vou atrás do aluno que falta à aula, ligo para o pai, procuro saber o que ele está fazendo. A educação com a criança não é isolada, tem que ser com a família inteira. O educador precisa ter a chave do companheirismo. O aluno tem que se sentir respeitado e importante. O trabalho não é só em sala”, conta a educadora, que diz já ter perdido a conta de quantas crianças alfabetizou.

Em tantos anos de ensinamento, uma das lembranças mais marcantes que dona Maria leva é a de uma aluna que pediu à mãe para cortar o cabelo e doar para ela, porque, segundo a garota, a professora tinha o cabelo curto. “Convencemos ela a doar para crianças com câncer”, conta com um sorriso no rosto.

Mas nem só de bons momentos vivem os professores, e se manter em sala de aula não é tarefa fácil nos dias atuais. Muitos deles têm que conviver com baixos salários, falta de estrutura e violência, situações que precisam driblar com criatividade e disposição.

Em Vespasiano, na região metropolitana, a professora de história Luana Tolentino, 34, apostou na meditação para combater a violência e a agitação dos alunos do ensino fundamental. Duas vezes por semana, antes de iniciar as aulas, ela conversa com os estudantes da escola municipal onde leciona e inicia exercícios de respiração e concentração. Segundo Luana, os alunos “mais difíceis” estão mais concentrados, brigam menos e respeitam mais.

“Tem sido impressionante. Começamos com três minutos, depois, cinco e agora estamos em dez. Percebo eles até mais afetuosos”, conta a educadora, que está há dez anos em sala de aula. “Eu vejo a escola como um lugar para trabalharmos o que há de melhor dentro de nós. A solução não está em punir. Temos muitos problemas: salários baixos, pouca valorização e estrutura ruim, e lutamos todos os dias por condições melhores. Mas dá para ter outra perspectiva. Apesar do caos, é possível ensinar com alegria”, lembra.

Qualificação. De acordo com a Secretária de Estado de Educação (SEE), em 2015 foi fechado um acordo com a categoria que estabeleceu reajuste de 46,78% nos salários ao longo de três anos, o fim do regime de subsídio, descongelamento da carreira, além da criação do Adicional de Valorização da Educação Básica, que garante 5% de aumento nos salários a cada cinco anos de serviços.

Nomeações. Segundo a SEE, o Estado atingiu em outubro a marca de 59.706 profissionais nomeados para atuar na rede estadual de ensino, dos quais 50.054 são para no cargo de professor. A meta é alcançar 60 mil nomeações.

Docentes se sentem desvalorizados

De acordo com a pesquisa Profissão Docente – iniciativa do Todos pela Educação e do Itaú Social –, que ouviu 2.160 professores das redes municipal, estadual e particular do país, 78% dos educadores afirmam ter escolhido a carreira principalmente por aspectos ligados à afinidade com o trabalho. No entanto, metade deles não recomenda a profissão por considerá-la desvalorizada.

Para reverter a desmotivação, os docentes apontam como medidas mais importantes para a valorização da carreira, em primeiro lugar, a formação continuada (69%) e a escuta dos docentes para a formulação de políticas educacionais (67%) e, em segundo lugar, a restauração da autoridade e do respeito à figura do professor (64%) e o aumento salarial (62%).

Incentivo. “É muito triste um profissional nessa situação. Mas percebemos que, apesar de não recomendarem a profissão, os professores têm um interesse enorme em se aperfeiçoarem mesmo que tenham longas jornadas de trabalho, atuem em vários locais e tenham salários baixos. É preciso incentivo e qualificação também social do trabalho do professor”, avaliou Sônia Dias, coordenadora de implantação do Itaú Social.

Estado. O salário inicial vigente na rede estadual de ensino para o cargo de professor da educação básica é de R$ 2.135,64, para uma carga horária de 24 horas semanais. Segundo a SEE, foram concedidos, desde o início desta gestão, quatro reajustes para todas as carreiras da Educação.

Agredido, mas firme no trabalho

Tiago Assis Silva, 26, formou-se em engenharia civil, mas o desejo dele mesmo sempre foi ser professor. No entanto, uma semana após começar a lecionar matemática pela primeira vez na vida, Silva foi agredido por dois alunos na Escola Estadual Doutor Moreira Brandão, em Camanducaia, no Sul de Minas. O motivo: ele pediu que os jovens parassem de jogar bola em sala de aula.

O caso está sendo investigado até mesmo pelo Ministério Público, mas não fez com que Silva desistisse do sonho de poder ensinar. “Desanima um pouco pela forma que os alunos estão tratando os professores, sem respeito nenhum. Mas é meu sonho, é gratificante ver a parcela de estudantes que se empenha e se mostra interessada na matéria”, lembra Silva.

Em um vídeo que circula em redes sociais, é possível ver os alunos e o professor brigando no chão, na frente de uma turma do sétimo ano. A confusão aconteceu em 25 de agosto passado. De acordo com Silva, os dois estudantes jogavam bola dentro da sala e não gostaram quando ele pediu para que parassem, pois estavam atrapalhando a aula. O professor conta que pegou a bola e, quando um dos alunos tentou tomá-la, o empurrou, dando início à briga. “Eu caí, bati as costas na cadeira. Me chutaram e pisaram no meu rosto”, lamenta.

Estado. Segundo a Secretária de Estado de Educação, os estudantes envolvidos no caso foram transferidos para outra unidade. A escola também iniciou um projeto pedagógico de convivência democrática.