O governo federal comemora a queda no índice de violência em nosso país, em razão da redução de ocorrências de crimes violentos no primeiro trimestre de 2019, comparado com igual período de 2018. Diminuíram, significativamente, os roubos a instituições financeiras (41%) e os roubos de carga (38%). Ainda, 30% no roubo de veículos e 23% de latrocínios. Para quem foi considerado campeão mundial de homicídios (próximo de 64.000, em 2017), 22% de recuo nesta modalidade criminosa representam uma vitória da vida.
No plano nacional, São Paulo teve queda expressiva no número de homicídios e o Ceará, que fora recordista em elevação do índice de mortes violentas, teve redução de 57,9% nesse quesito, no primeiro bimestre deste ano. Essa queda, para alguns, foi motivada pela excelente coordenação de vários projetos da Secretaria de Segurança, com destaque do específico para a Execução Penal Administrativa (sistema penitenciário?). Outros, não muito otimistas, acreditam que isso se deu em decorrência de um acordo entre facções criminosas rivais e não por ação governamental. No livro Freakonomics, mutatis mutandis, encontra-se citação de que a queda da criminalidade nos anos 90, em Nova York, teria sido em decorrência dos vinte anos da lei do aborto, e não por conta do programa Tolerância Zero.
Quero crer que todas essas hipóteses são possíveis, mas, para se identificar a probabilidade de cada uma, seria necessária uma pesquisa mais aprofundada, o que não é objeto deste artigo.
Quase que simultaneamente, o governo de MG também comemorou queda expressiva no número de crimes violentos. Conforme a Agência Minas, “O resultado do primeiro semestre de 2019 é 26,8% menor que o do mesmo período no ano passado, com 12.608 crimes a menos nos seis primeiros meses deste ano no estado. A redução chega a 53% quando é avaliada em relação ao pico da criminalidade violenta em Minas, ocorrida em 2016 (38.748 crimes a menos ocorridos em seis meses). Também pode-se afirmar que Minas Gerais retrocedeu a índices de criminalidade violenta menores que os do ano de 2012, com 2.371 crimes a menos neste semestre que os ocorridos naquele ano”.
Enfim, quaisquer que tenham sido as causas, o fato é que tivemos decréscimos relevantes e, assim, os números devem ser comemorados nas duas esferas de governo, ainda que – é oportuno lembrar – estatística criminal refira-se à insegurança objetiva. O outro lado da medalha, a insegurança subjetiva, a sensação de insegurança, a ilusão de isotopia somente se reduz com a crença da população nesses números. Significa dizer, quando ela acredita que está efetivamente protegida contra vulnerabilidades no tecido social (por falhas institucionais) e contra ameaças ao organismo social (no caso presente, a criminalidade) que afetam a preservação e a perpetuação da espécie. E o fortalecimento dessa postura da população (de acreditar nos números) é menos uma tarefa policial que uma ação de comunicação social.
Talvez fosse interessante os órgãos de estatística dividirem os crimes violentos em externos e internos. Os externos seriam aqueles praticados burlando o trabalho policial (inibir vontades e obstaculizar oportunidades), enquanto os internos teriam origens em conflitos (briga de casais, de vizinhos, de clientes, de trânsito, de facções, etc.) que evoluem para confrontos, quase sempre letais, motivados por ódio, rancor, ciúme, mágoa, vaidade, intolerância, covardia, vingança e similares que fogem, quase na totalidade, do controle, da contenção policial (prevenção e repressão). Aí, a sociedade seria mais bem informada quanto às iniciativas do governo para lhe dar proteção e quanto às alterações nas taxas de violência, que fundamentariam queixas ou elogios, medos e alívios.
O mais importante é que daria transparência à insegurança resultante, menos da propalada ineficiência do trabalho policial e, sim, da dissimulada deficiência de caráter na população marginal (não confundir com marginalizada).
Bem esclarecida, certamente, a sociedade entenderá que os crimes, principalmente os internos, ocorrem, quase sempre, por violação ao pacto social, onde indivíduos não obedecem às regras sociais e nem respeitam valores sociais. E aí, algo já detectado, mas não corrigido: nosso calcanhar de Aquiles é a Educação, que, ainda na base, não forma cidadãos, aqueles que reivindicam direitos, mas cumprem os deveres sociais. Assim, é de se perguntar por que outros países – com IDH (índice de desenvolvimento humano) menores que o nosso, com taxas de desemprego maiores que as nossas, com piores Índices de Gini (que mede a desigualdade social) – têm índices de violência (subproduto do índice de criminalidade) menores que o nosso? Porque, desde crianças, aprendem e praticam que viver em sociedade é, originariamente, respeitar valores sociais e obedecer às regras de convivência social.
Por aqui, constata-se que um percentual significativo de nossa população (a marginal, não a marginalizada) é composto de meio-cidadãos. E não é difícil concluir que isso ocorre porque temos deficiências na formação do caráter moral.
De passagem, lembra-se que, tempos atrás, a moldagem do caráter da criança tinha origem na Família (mais fortemente com a mãe, dedicada aos trabalhos do lar), na Escola (que fazia a lapidação, principalmente com a Educação Cívica) e a Igreja (que reforçava valores morais e espirituais). Hoje, a estrutura familiar está bastante diversificada, não permitindo o trabalho basilar de outrora, então transferido aos avós, aos tios, aos vizinhos, às babás, aos quais, em grande parte, falta a autoridade que, fatalmente, deveria ser dada aos professores, pedagogos e demais profissionais de Educação. E não basta delegar a autoridade! É necessário dar-lhes sustentação.
Finalmente, hoje comemora-se a redução da Insegurança objetiva. Amanhã, quem sabe, estaremos comemorando reduções na Insegurança geral. Para isso, convém priorizar a Educação Integral (Intelectual, Física e Moral) em Escolas Integradas, além de valorizar os profissionais dessa área.
(*) Coronel Reformado da PMMG
Foi Comandante da Região Metropolitana de BH