Qualquer dona de casa sabe que se gasta mais do que ganha a conta não vai fechar no final do mês. Se é assim dentro de casa é assim nas contas das Cidades, nos Estados e do País. Neste momento o Brasil está entre a cruz e a espada. Se correr o bicho pega se ficar o bicho come.

Divulgados os números da economia do primeiro semestre fica muito claro que o governo federal está gastando muito mais do que arrecada. E se, para sustentar esse gasto maior, o governo quiser arrecadar mais, vai acabar matando nossa bela galinha, já que a carga tributária do Brasil é altíssima. E o problema não é que não estamos arrecadando muito. O problema é que a receita não está crescendo mais do que o PIB porque o país não está contando mais com fatores que impulsionaram a receita nos últimos anos, incluindo preços mais altos de commodities e, na pandemia, um maior consumo de bens, que são mais tributados do que os serviços.

A economia brasileira fechou o primeiro semestre do ano com um desempenho consideravelmente mais forte do que o inicialmente previsto, mas as receitas públicas caíram no período, destacando as incertezas em torno dos esforços para reequilibrar as contas públicas e manter novas regras fiscais de pé. Na visão de economistas e integrantes do governo, esse descasamento destaca o caráter desigual da tributação sobre os setores, levando incerteza para a arrecadação cujo planejado aumento é um elemento crucial do plano do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de zerar o déficit primário no ano que vem.

Após a indústria extrativa ter ajudado o PIB (Produto Interno Bruto) do segundo trimestre a surpreender positivamente, na sequência de um robusto primeiro trimestre alavancado pela agricultura e estes setores são exportadores e estão sujeitos a impostos mais baixos. Isso faz muita diferença.

O Brasil também está assistindo a uma diminuição substancial das importações, principal fator por trás de um superávit recorde para a balança comercial no acumulado do ano, o que tem afetado a arrecadação, já que no país a carga tributária sobre os produtos adquiridos de fora, de maneira geral, é alta. O que se espera é uma mudança nessa dinâmica, a arrecadação no segundo semestre vai continuar mais estagnada: o PIB que paga imposto não deve reagir, principalmente a indústria da transformação e o comércio, já que apesar de ter melhorado a perspectiva para o crescimento da economia este ano a 2,8%, de 2,2% antes, vê um déficit primário maior ao fim do ano, de 1,1% do PIB, de 0,9% previsto anteriormente. Grande parte do PIB mais forte neste ano será devido à agricultura, "que não paga impostos". Ao mesmo tempo, a forte base de comparação com o ano passado cria ruídos que dificultam a análise interna do governo sobre o desempenho estrutural das receitas.

Vale lembrar que a arrecadação no Brasil é estruturalmente maior sobre o consumo, o que faz com que também reaja rapidamente à inflação, que no primeiro semestre desacelerou a 2,87%, quase metade dos 5,49% registrados nos primeiros seis meses de 2022.

A receita líquida do governo central sofreu uma queda de 5,3% de janeiro a junho, afetada pelo tombo expressivo na receita com concessões, que foi impulsionada no ano passado pela desestatização da Eletrobras e pela segunda rodada dos leilões de reservas de petróleo da cessão onerosa.

O governo também recolheu muito menos dividendos de empresas estatais, notadamente dos bancos públicos BNDES e Caixa Econômica Federal e da Petrobras. que teve resultados expressivos em 2022 em meio à escalada dos preços do petróleo.

De lá para cá, o preço da commodity também arrefeceu, ajudando a explicar as menores receitas com royalties de petróleo. Fica claro que a arrecadação de 2022 foi muito influenciada pelo preço do petróleo e pela inflação.  E a indústria será mais beneficiada à medida que avance o processo de redução dos juros, mas é preciso ter claro que a base de comparação do ano passado é muito alta.

Após reconhecer que as receitas caíram drasticamente em julho, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que o país estaria com "problema grave na economia" se o banco central não tivesse iniciado seu ciclo de flexibilização monetária em agosto.O BC reduziu a taxa de juros em 0,5 ponto percentual para 13,25% e sinalizou mais cortes da mesma magnitude em suas próximas reuniões. Não devemos esquecer que os custos mais baixos de empréstimos podem ajudar notavelmente o futuro da indústria, e que medidas de aumento de receita pelo governo podem acabar sendo contraproducentes.