por Sérgio Marchetti
Por acaso, caros leitores, vocês conhecem um avô que mergulha na piscina com os netos, brinca como se fossem da mesma idade, dá “caldo”, faz rir e também chorar quando as crianças bebem aquela água de cloro? E um avô que vai para o parque com um carro cheio de netos de cinco a doze anos e participa de todos os brinquedos; indo da roda gigante ao trem fantasma? E que leva na sorveteria e dá gargalhadas pelo exagero que alguns “anjinhos” cometem ao servirem seus sorvetes? Um avô que conserta brinquedos, mochilas, tênis? E além disso, faz sorvetes em casa junto com os netos numa algazarra generalizada. Vocês conhecem? Também com as pipocas não é diferente. Pipocas estourando e enchendo os saquinhos para dar aparência bem profissional. Mas não é de agora, com os filhos também sempre foi assim, participativo. Jogavam, juntos, futebol e peteca. Nas férias, era o companheiro principal nas viagens para a praia e, no mar, era quem mais avançava para mergulhar e furar as ondas.
Depois, vinha o almoço com camarões; sua comida predileta.
Meu tio o apelidou de avoroço, tamanho o estardalhaço que fazia ao jogar balas de todas as cores para cima, e ver a confusão que a criançada fazia, se divertindo com as disputas para pegarem as balas. Os menores ficavam aos prantos por não conseguirem apanhar as guloseimas. Mas havia algumas surpresas guardadas para os menos favorecidos. Bombons, pirulitos e outros doces.
Diariamente, lia jornais, e durante sua longa vida de 94 anos, esteve sempre atualizado. E, falante como era, transmitia todas as notícias para a família. Gostava de serestas e, tendo espírito alegre, cantarolava as marchinhas e as canções do carnaval.
Eu disse “era”, “gostava”, “cantarolava”, no pretérito perfeito. Pois, num pretérito mais que perfeito para nós, vivera, esse avoroço, para nos alegrar. Mas “um dia tudo mudou, a vida se transformou e nossa canção também…”. O verbo mudou de tempo. Virou passado e os risos se converteram em lágrimas. Sim, ele nos deixou há um mês. Ficamos mais fracos, mais tristes e mais pobres com a sua partida. Um vazio e um silêncio mortais tomaram conta de nós. Os dias perderam a cor. Concluímos que quando uma pessoa de presença tão forte nos deixa, a dor da ausência é mais sentida. De personalidade marcante, foi um homem inteligente, exigente, destemido, protetor, pragmático e, simultaneamente, uma pessoa de extremo carinho.
Viveu com toda sua energia até o último dia. Partiu como viveu, lúcido e sem reclamar da vida. Aos poucos, nas últimas horas — assim como a lagarta se transforma em borboleta — o sono se transformou… e ele transcendeu numa paz magnifica.
Eu sabia que iria doer. E que iria fazer muita falta. Sabia sim ”…que doía tanto, uma mesa num canto, uma casa e um jardim… Naquela mesa está faltando ele e a saudade dele está doendo em mim”.
Meu querido pai, Altair Marchetti, deixou um legado de integridade, honestidade, força e de valorização da família. Seus exemplos e virtudes nos servirão de guia para que nunca nos desanimemos, nem nos desviemos do caminho da honestidade, da lisura e da retidão, mesmo que para muitos isso não pareça ser valor.
Que meu pai esteja em paz e que a dor e a saudade se transformem em energia positiva para que nossos espíritos possam abraçá-lo e iluminar a sua caminhada na atual dimensão.
Obrigado por tudo!