Este é o estranho título da agenda produzida pela parceria Instituto Igarapé, Instituto Sou da Paz e Fórum Brasileiro de Segurança Pública, lançada dia 02 p.p. Numa síntese, o trabalho apresenta sete eixos programáticos, para os candidatos à Presidência da República desenvolverem na área da segurança pública (usando essa expressão, equivocadamente, como sinônimo de enfrentamento à criminalidade, particularmente a violenta, visto que segurança é um fim e não um meio).
Embora não apresente qualquer coisa que profissionais da área já não saibam, a obra tem o grande mérito de compilar e organizar propostas esparsas, encontradas em vários trabalhos, em várias manifestações. Está centrada em duas prioridades eleitas por seus organizadores: redução e prevenção de crimes violentos e enfraquecimento das estruturas do crime organizado. Razoáveis, mas não suficientes, visto que a ênfase na redução de causas – esta sim, absolutamente prioritária – não foi considerada.
De uma maneira geral, as ações sugeridas referem-se, apenas e lamentavelmente, a medidas de contraposição ao “que” está acontecendo, vale dizer, o que fazer para mitigar, reduzir os números dessa macabra estatística diária da criminalidade violenta. O que, convenhamos, para receber a chancela de entidades do gabarito das organizadoras, é um esforço absolutamente insuficiente, em razão de não abordar, com prioridade, o “por que” está acontecendo. Escusas pela citação, mas é o cachorro continuando a correr atrás do rabo. Indo na linha de outros trabalhos, a agenda apresenta, com destaque, sugestões relativas à contenção policial (prevenção e repressão de crimes). Ora, isso é um erro grosseiro e repetitivo, cometido pelos teóricos, que não têm a sensibilidade de perceber que essa contenção é insuficiente para fazer frente à evolução da espiral da violência, pelo fato de haver fatores geradores que fogem ao controle das instituições policiais, cujo peso, porém, recai sobre elas. Portanto, em um trabalho a ser ofertado ao futuro presidente, é imprescindível, aliás, fundamental, prioritário elencarem-se as causas dessa inquietante, angustiante criminalidade violenta e como minimizá-las ou mesmo reduzi-las.
Metaforicamente, o tratamento dado a esse problema social é como se estivéssemos em uma sala fechada, onde, em uma parede há uma abertura de 01 (uma) polegada, jorrando água. Em outra, diametralmente oposta, há uma saída d’água de 0,5 (meia) polegada. No início, uma pessoa com um rodo tenta secar a sala, tarefa que se mostra impossível, em razão da relação entre entrada e saída da água. Surgem, então, brilhantes propostas: aumentar o número de pessoas; aumentar o tamanho do rodo; usar rodo elétrico, sistematizar o trabalho de remoção da água, realizar obras de abertura da vazão de 0,5 para 01 polegada, e outras mais. O problema não se resolveu porque essas ações são paliativas. A solução está na redução da bitola de entrada da água, ou seja, atuar sobre as causas, freá-las, diminuí-las.
Portanto, acredita-se que os candidatos devem ser alertados para a necessidade de elaborar um trabalho multidisciplinar que vise à identificação e definição de causas dessa violência explícita e da violência dissimulada (crime organizado), bem como estabeleça diretrizes para correções.
Assim, as entidades, que elaboraram a agenda, aproveitando o embalo, não deveriam olvidar propostas para mitigar, reduzir e restringir a crise ética que afeta grande parte do nosso corpo social; que visem a recuperação de valores pouco respeitados ou, até, esquecidos; que estimulem a obediência à ordem nacional e à social; que fixem ações de fortalecimento da prática da salutar (atualmente combalida) cidadania; ainda, para sistematização de ações estruturadas e planejadas de atenção, prevenção, proteção e atendimento a crianças e adolescentes, com esteio na educação e na família. As necessidades relativas a planejamento, treinamento, integração de políticas, corregedoria, política pública unificada, compartilhamento de informações, desenvolvimento de sistema de inteligência unificado e afins poderiam ser supridas com um Conselho Nacional de Polícia, nos moldes do CNJ e do CNMP.
Enquanto nossas faculdades oferecem cursos para especialidades e, dentro delas, para especificidades, constata-se, na contramão, a insistência em sugerir escola de formação única para os profissionais dos ecléticos ramos de polícia. Felizmente, a nefasta ideia de unificação de polícias nem foi sugerida.
Quanto ao sistema prisional, de fato, necessita constituir-se em um específico eixo programático, pois, efetivamente, necessita de revisões nos campos da inteligência, administrativo, logístico, operacional e tecnológico. Qualquer furo nessa área pode jogar por terra todo o trabalho anterior de contenção criminal e de persecução penal. Os estabelecimentos penais estão, pouco a pouco, sendo dominados por facções criminosas, porque os agentes penitenciários não têm reconhecida sua autoridade policial, recentemente vetada pelo senhor presidente. A PEC está no Congresso. Rejeitando o veto, reconhecendo a existência secular da Polícia Penal, nossos parlamentares estarão prestando uma ajuda antecipada ao futuro presidente, na área da salvaguarda social, que alguns confundem com segurança pública.
Enfim, o documento segue a linha de outras produções que insistem em oferecer propostas para enfrentar a ocorrência de crimes violentos, ou seja, para o meio do ciclo dessa violência, quando as grandes vulnerabilidades estão no início e no fim. Para o início, onde estão as causas, os fatores geradores, a solução é priorizar a educação e os educadores. Ao fim do ciclo, onde está o sistema de execução penal administrativa (sistema prisional), implantar ações que visem a respeitar a dignidade do preso e a resgatar a autoridade do agente penal.
(*) Coronel Reformado da PMMG
Ex- Comandante da Região Metropolitana de BH