Já se passaram onze dias do rompimento de mais uma barragem de rejeitos de minério de ferro construída por alteamento a montante na mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG), pertencente à Vale Sociedade Anônima. Fico pensando sobre a avalanche de fatos, dados, informações e até conhecimentos consolidados que estão sendo difundidos por diversas mídias. É inquestionável a dimensão da tragédia humana em todos os seus aspectos, a começar pela dor trazida pela morte de quase 400 pessoas das quais ainda falta encontrar a maior parte dos corpos. Para quem mora num dos 34 municípios da região metropolitana de Belo Horizonte, como eu por exemplo, fica a sensação que tudo aconteceu muito pertinho de nós, logo ali a 5, 10 ou 20 km de onde moramos, trabalhamos ou frequentamos em busca de lazer. Também fica uma pergunta passeando pela mente, que vai e voltam querendo saber ou imaginar como estariam as coisas se eu, nós ou um de nossos parentes ou amigos estivéssemos lá no local onde aconteceu o acontecido.

Passaram-se apenas 11 dias, mas o que aguarda os envolvidos direta e indiretamente na tragédia nos próximos dias, meses e anos? Se tudo começa com a gente e a desgraça é individual dá para imaginar a ordem de grandeza das perdas de cada parte e do todo, chamado sociedade, com seus diferentes grupos de interesse vivendo num país típico do capitalismo tardio?

Em meio a tanta inquietação e na plenitude do veranico que retarda o sono só aumenta a entropia trazida pela lama que desceu da barragem. Mas, se quanto maior a entropia mais próximos estaremos da solução para o problema, é preciso também saber se existe um querer que implique na busca de uma solução que leve em conta todos os interessados, e não apenas parte deles, segundo as melhores práticas em prol da sustentabilidade em todas as suas dimensões.

Como isso ainda é só um ideal, quase que uma utopia, dá para entender porque a história se repete, primeiro como tragédia e depois como farsa. Basta lembrar que uma barragem de rejeitos de minério de ferro com alteamento a montante se rompeu há pouco mais de três anos em Mariana e quase nada mudou de lá para cá. No momento estamos passando por um grande brainstorming, tentando encontrar as causas fundamentais e prioritárias que levaram a esse efeito tão trágico. Da ganância dos donos da Vale – focados na máxima lucratividade para seus investimentos – passando pelas ações e omissões do estado e seus agentes e chegando-se até as condições em que se realiza o trabalho na mineração, diversas são as causas que tem surgido nas discussões sobre essa tragédia de Brumadinho.

É importante lembrar que um dos donos da Vale é a Litel Participações com, 20,98% das ações. A Litel é formada pelos fundos de pensão dos empregados do Banco do Brasil (Previ), da Caixa Econômica Federal (Funcef), da Petrobras (Petros) e da Cesp (Funcesp). Entre outros acionistas da Vale estão o BNDESPar e o Bradespar além de ações comercializadas em bolsas de valores.

Enquanto isso fico me perguntando se serão necessários mais três anos para que se removam as causas da atual tragédia e também penso no que poderá ser feito para desativar as bombas relógio instaladas em barragens de municípios como Rio Acima, Nova Lima, Itabirito, Congonhas e Itabira, por exemplo. Afinal de contas depois de “Mariana nunca mais” chegou a vez de “Brumadinho nunca mais”. Será que haverá um próximo nunca mais?

Parafraseando o educador Paulo Freire “é fundamental diminuir a distância entre o que se diz e o que se faz, de tal maneira que num dado momento a tua fala seja a tua prática.” A necessária transformação que o momento aponta continua desafiando a todos e a cada um nas partes que lhes cabem nesses tempos liberais.