A aposentadoria do trabalho é um tema que mexe de muitas maneiras com as pessoas em seu curso de vida. E acaba gerando preocupações enquanto o tempo de labor vai maturando até se cumprir os requisitos necessários conforme as regras definidas pelas leis. A premissa é que tudo caminhe na mais santa paz. Mas como a vida é um risco, inclusive no trabalho, muitas são as causas que podem adiar ou mesmo limitar as condições que regerão uma determinada aposentadoria. Dá para imaginar as apreensões geradas por propostas de reforma da previdência social privada e dos regimes próprios dos servidores públicos em busca de um equilíbrio das contas públicas que impacta nos direitos adquiridos, inclusive de castas.
Digamos que, ainda assim, chega o momento em que é possível se aposentar e muitos são os casos daqueles que quase nem aguentavam continuar trabalhando até completarem as condições necessárias. O que fazer para prosseguir no curso da vida após o dia seguinte à aposentadoria ou depois do quadragésimo dia?
Esse tipo de planejamento não foi feito pelo assistente administrativo Rominho Talarico, que se aposentou aos 57 anos no final de 2017. Desde então ele passou a ficar em casa praticamente o tempo todo, sem muita definição clara do que fazer e, ao mesmo tempo, tentando se mexer aleatoriamente em busca de atividades para encontrar coisas para preencher o dia. Ler jornais, ouvir emissoras de rádio, assistir à programação da televisão e atuar nas redes sociais digitais foi um bom começo, mas não demorou muito a ficar um pouco enfadonho, ainda mais diante de confrontos regidos pela intolerância, raiva e ódio.
Fazer compras em padarias, sacolões e supermercados para suprir necessidades da semana ou do dia, sempre pesquisando melhores preços, acabou gerando fadiga na relação com a esposa, aposentada alguns anos antes, por divergências em relação às quantidades, marcas, preços e formas de pagamento. Isso levou a seu afastamento da atividade para preservar a duradoura relação de todo o tempo de seu trabalho profissional, quando não participava desse tipo de atividade. O jeito foi focar mais no futebol e acompanhar tudo de seu time do coração em todas as competições disputadas. Logo veio uma restrição por parte da esposa ele não poderia gritar ou berrar o nome do seu time em caso de um gol assinalado, apenas manifestar discretamente a sua satisfação.
Nesse contexto do cotidiano acabou surgindo mais uma atividade para Rominho. Seu neto mais novo, de quase um ano, passou a ficar em sua casa durante o dia para que sua mãe voltasse ao trabalho na sala de aula de uma escola municipal. Avô e avó passaram a se dedicar prioritariamente ao neto, com muito amor e crescente admiração por todos os seus feitos no processo de crescimento. Acontece que no final de setembro, após três meses cumprindo a missão, o avô já demonstrava grande ansiedade para que o neto dormisse nos horários planejados, principalmente no meio da tarde. Todos os barulhos gerados pelo edifício de 4 andares e também 4 apartamentos por andar passaram a incomodar cada vez mais ao avô que, aliás, mora no primeiro andar. Manobras de carros e motocicletas na garagem, música alta nos dois apartamentos de cada lado do seu, crianças brincando no corredor fazendo algazarra e outros acontecimentos mais típicos de um condomínio residencial acabaram “tucicando”, incomodando cada vez mais o dia-a-dia de Rominho.
Foi assim que ele acabou surtando na tarde da sexta-feira 28 de setembro, quando totalmente descontrolado partiu para o ataque a seus vizinhos, falando muitas asneiras e exigindo que naquele horário prevalecesse a lei do silêncio. Logo alguém acionou a polícia, que não apareceu de imediato, enquanto uma moradora do segundo andar tentava localizar o síndico. Instalado o caos, só algum tempo depois as coisas foram voltando à serenidade.
Desgastado e deprimido com os acontecimentos Rominho Talarico chamou a família, inclusive o genro, para uma reunião onde expôs os seus transtornos de ansiedade. Segundo ele a causa principal era não ter se preparado para viver fora dos aposentos após ter se aposentado há apenas nove meses. Pediu ajuda para começar a fazer o que não foi feito por ele e nem pela sua esposa. Também pediu à filha e ao genro que buscassem rapidamente uma solução para o neto, que poderia ser uma creche, por exemplo. Finalmente disse que procuraria ajuda médica até superar a fase mais difícil da qual espera sair brevemente. De lá para cá já se passaram 18 dias.