O governador eleito, Romeu Zema, definiu (quase) a equipe que, tecnicamente falando, vai trabalhar na salvaguarda da sociedade de Minas Gerais, integrando o esforço de mitigação da Insegurança Social. Para secretariar a segurança pública (denominação inadequada) convidou o general Mário Lúcio Alves de Araújo. Em razão de missões já cumpridas em nosso Estado, certamente ele está bem informado sobre as nuances do cargo e, por ser mineiro, a exemplo de outros integrantes do time, conhece o ambiente onde brotam mineirismos, mineirices e mineiridades, Para o comando da Polícia Militar, designou o coronel Giovane Gomes da Silva, conhecido como “extremamente operacional”, nome que agradou a quem está nas ruas, no embate diário. Para o gabinete militar, funcionou a astúcia mineira, quando o governador coloca, a seu lado, um dos maiores conhecedores dos meandros da área da inteligência estadual, o coronel Evandro Geraldo Ferreira Borges.
Para o comando do Corpo de Bombeiros, o coronel Edgar Estevo, cuja invejável liderança e rara habilidade política têm contribuído para que sua instituição seja conhecida e reconhecida como a fênix mineira. Para a chefia da Polícia Civil, o escolhido foi o delegado Wagner Pinto, visto por seus pares como administrador proativo e de postura assertiva. Para a defesa civil (que deveria integrar esse núcleo), o designado foi o coronel Alexandre Lucas, um dos maiores especialistas dessa área, em nosso Estado. Estão faltando as designações para a Polícia Penal (que existe de fato, mas, ainda, não reconhecida constitucionalmente) e para a chefia do órgão responsável pela operacionalização de medidas socioeducativas, setores da execução penal administrativa que, se não funcionarem muito bem, jogam por terra todo o trabalho anterior da contenção criminal e da persecução penal.
O conjunto de atributos e de requisitos dessas autoridades habilitou-as a serem convocadas para essa tarefa, ressalte-se, extremamente difícil. Cuidarão da articulação de trabalhos específicos de mitigação da violência, particularmente a da criminalidade, de socorrimento público, com ênfase na prevenção de desastres, de custódia e ressocialização de presos e de medidas socioeducativas para jovens infratores. Um dos trabalhos prioritários, e complexo, é a elaboração de políticas públicas, que darão o Norte para os órgãos policiais. A complexidade está no fato de as origens das ameaças ao corpo social estarem em outros órgãos, que não a secretaria em questão, gerando a necessidade de trabalho multidisciplinar, envolvendo, principalmente, órgãos externos à pasta.
Para a secretaria poderia ser designado qualquer outro profissional, desde que qualificado. Aliás, curiosamente, ela tem sido ocupada, quase sempre, por integrante de uma mesma classe que, simultaneamente, tinha colegas ocupando altos cargos, no nível nacional e no estadual. Assim, tivemos, num mesmo período, secretários que eram ora políticos, ora do judiciário, ora cientistas sociais e, ultimamente, delegados da polícia federal. No momento, o governo que vai assumir a direção do país joga as fichas na liderança, na capacidade de militares, principalmente de generais que, simetricamente, ocuparão cargos federais e estaduais de segurança.
Oficiais do Exército, que já foram secretários nessa pasta, saíram-se muito bem, certamente porque entenderam e se ativeram ao núcleo de sua responsabilidade, que era tão somente coordenar, articular medidas de restrição e redução da insegurança social. Não se preocuparam em bancar iniciativas de aplicação da genuína doutrina bélica na atividade civil de proteger a sociedade, mas ocuparam-se em conceber adaptações de sistemas de planejamento às peculiaridades dos conflitos civis, inclusive submetendo-se aos preceitos da então novel Policiologia, que hoje caminha para a sedimentação.
De volta ao quesito qualificação, certos secretários capitularam por não terem sensibilidade, nem habilidade para solucionar conflitos internos e confrontos externos. Alguns começaram errando, ao pressuporem que, por força do cargo, a função seria comandar as específicas organizações policiais, quando, na verdade, a incumbência se restringe à coordenação, à harmonização de esforços institucionais. Convém lembrar que, no plano federal, há o Ministério da Defesa, que não tira a autonomia das 03 (três) forças públicas federais, e é responsável pela articulação, visando à segurança nacional. Guardadas as devidas proporções, o modelo se repete nos Estados, sendo a secretaria de segurança a responsável pela salvaguarda social, que integra a segurança social, antessala da segurança nacional. As origens, o conhecimento e a experiência dos profissionais designados ajudarão na concepção e na operacionalização de medidas específicas para eventos relativos à evolução dos estágios da ordem social (confundida com ordem pública), de normalidade à grave perturbação, facilitando eventual transpasse, ocasião em que as forças públicas estaduais passariam o comando das operações de restauração para as forças públicas federais. É extremamente importante que seja estimulada a mantença de estreito relacionamento com as forças federais e com as forças municipais.
Especificamente, quanto aos órgãos policiais, é absolutamente necessário acreditar que o secretário auxiliará a sepultar a esdrúxula proposta de unificação de polícias, visto que a instituição, denominada Polícia Militar, é a força pública estadual, encarregada da garantia da ordem social, e a Polícia Civil é a polícia judiciária estadual, encarregada de investigar autoria e materialidade de delitos. Portanto, o foco da força pública estadual (a PM) é a ampla ordem social, enquanto o foco da polícia judiciária (PC) é o crime. No plano federal, impensável uma fusão das Forças Armadas, forças públicas federais, com a Polícia Federal, polícia judiciária da União.
A interação, reconhecidamente oportuna (conveniente e necessária), não deve ser confundida com a nefasta integração. Aliás, a Polícia Civil, que sempre teve, em seus quadros, ótimos profissionais, não é mais produtiva em razão de graves deficiências administrativas, logísticas e tecnológicas que precisam ser supridas. Nada a ver com a fusão!... Aliás, na contramão dessa fusão, dessa integração, a atividade policial deve ser capilarizada, com especialidades e especificidades, como é o caso da Polícia Técnico-Científica (mais conhecida como a Criminalística), que deveria ser órgão autônomo em MG, o que não ocorre apenas em mais outros 02 (dois) Estados. Em relação à Polícia de Socorrimento Público (o Corpo de Bombeiros Militar), a fênix mineira, desde que se separou (desfez a unificação) da Polícia Militar, toda atenção e apoio devem ser mantidos, visto que é considerada referência nacional. Ao final, está a Polícia Penal (ainda não reconhecida constitucionalmente) que, basicamente, deve trabalhar buscando, minimamente, consolidação de dois princípios doutrinários: respeito à dignidade do preso e resgate da autoridade do agente penal.
A equipe deve estabelecer contatos com outros órgãos que possam auxiliar a mitigar as causas da violência; participar de esforços para minimizar a distopia estatal (funcionamento anômalo de órgãos públicos); endossar ações de valorização dos profissionais da área. De urgência, implantar correções no sistema de execução penal administrativa (sistema penitenciário), sob pena de jogar por terra todo o trabalho da polícia ostensiva e da polícia judiciária, no particular, ou da contenção criminal e da persecução penal, no geral. Convém apoiar e estimular a coordenação nacional das atividades policiais, face a criminalidade sem fronteiras, que pode tomar corpo com a efetiva implantação do SUSP (sistema único de segurança pública), péssimo nome para uma ótima ideia. Ao fim, sem bairrismo, a expertise da polícia mineira tem de ser um dos exemplos a serem seguidos (vide mapa da violência), ou seja, Brasília deve escutar Minas.
(*) Coronel Reformado da PMMG
Ex-Comandante da Região Metropolitana de BH