Estamos na época de divulgação do balanço contábil de empresas, União Federal, estados e municípios. É também época das pessoas físicas se acertarem com a Receita Federal por meio da declaração anual do imposto de renda.
No caso específico do poder público é importante lembrar que tudo o que se movimentou durante o ano de 2017 foi precedido pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e pela Lei Orçamentária Anual (LOA). Esta prevê as receitas e despesas do ano seguinte e deve ser aprovada pelo Poder Legislativo correspondente até o final de cada ano, conforme determina a Constituição Brasileira.
Entretanto o orçamento ainda não é tratado com a importância que tem na gestão e, em boa parte dos casos, acaba sendo apenas uma mera peça orçamentária para cumprir uma Lei, mesmo diante de todas as exigências contidas na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O ideal, que segue longe do real, seria a elaboração de um orçamento com receitas, gastos e investimentos alinhado com o planejamento estratégico. Ele deve resultar de um processo participativo de discussão e formulação segundo um determinado modelo de gestão estruturado que funcione de maneira dinâmica e orientada para resultados. Essa prática contínua de planejar, priorizar, orçar, implementar, avaliar, corrigir, melhorar, inovar e se reposicionar exige muito querer, disciplina para aplicar o método de gestão, constância de propósitos com foco, determinação, liderança e cooperação entre os participantes do processo. O desafio é cada vez mais reduzir a distância entre o que é orçado no planejamento e o que é realizado na gestão operacional.
Um bom exemplo dessa distância pode ser encontrado no balanço do ano de 2017 da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, divulgado em fevereiro. A LOA previa receitas de R$11,6 bilhões, mas a PBH conseguiu realizar apenas R$9,7 bilhões, o que significa uma distância de 16,32% da meta estabelecida. Já as despesas pagas chegaram a R$9,1 bilhões enquanto as despesas liquidadas (assumidas) foram de R$10,4 bilhões. O déficit é inegável e sobrou para os restos a pagar em 2018. Quais seriam as causas principais desse resultado não alcançado? Uma delas pode estar ligada às premissas utilizadas na projeção da inflação, no crescimento – ou não – do PIB, na expectativa de receitas de capital, nos repasses do Governo Federal, por exemplo. Outra causa pode estar no conforto concedido pela Câmara Municipal ao poder executivo, autorizando um corte de até 30% nos gastos previstos caso as receitas esperadas não se confirmassem, sem necessitar de aprovação do Poder Legislativo. Esse mesmo percentual já foi de 10% e não faz muito tempo. O balanço mostra que R$600 milhões deixaram de ser gastos na saúde, R$250 milhões não foram para a educação e que apenas R$350 milhões foram investidos em empreendimentos (projetos e obras) diante de um orçamento de R$1,5 bilhão. Foi só cortar.
A análise do balanço também mostra que a PBH gastou R$4,5 bilhões para pagar os servidores municipais, R$500 milhões para o pagamento de juros e amortização da dívida e que aproximadamente R$450 milhões tiveram que ser destinados à cobertura do déficit da previdência municipal com servidores aposentados e pensionistas.
Como se vê ainda estamos muito longe da excelência. É preciso, inclusive, aprender a ler um balanço contábil, a analisar com mais responsabilidade a conjuntura e projetar cenários com alguns graus de realismo. A mesma PBH, cujo balanço foi aqui usado como exemplo didático, projeta em seu orçamento de 2018 uma receita de R$12,5 bilhões perante os R$9,7 bilhões registrados em 2017, ou seja, um crescimento de 22,4% num ano em que se projeta um crescimento do PIB na faixa de 3% a 3,5%. Será que teremos a repetição de uma nova peça orçamentária de ficção só para cumprir a Lei, que exige que se faça um orçamento?