Longa de Perry Lang, que estreia nas salas brasileiras nesta quinta-feira, se garante na boa atuação da dupla de protagonistas


A figurina divina já ganhou forma na telona com o icônico desempenho de Morgan Freeman na comédia Todo-poderoso (2003), com a imagem irreverente de Octavia Spencer em A cabana (2017) e com Antônio Fagundes dando vida ao protagonista de Deus é brasileiro (2003). Agora, o Criador ressurge na pele do veterano David Strathairn em Entrevista com Deus, longa de Perry Lang que estreia nas salas brasileiras nesta quinta-feira (15).

Paul Asher (Brenton Thwaites), repórter que acompanhou soldados americanos no Afeganistão, está de volta a Nova York. Traumatizado com a vivência no front, ele questiona a própria fé e enfrenta crise no casamento com Sarah (Yael Grobglas). Deus decide ajudá-lo. Acredita que propor uma entrevista seria a melhor alternativa.

O contato de Paul com o Todo-poderoso se divide em três conversas, que ocorrem num parque, no palco de um teatro e na sala de um hospital. A princípio, o jornalista duvida daquela experiência sobrenatural, mas resolve comprar a ideia, curioso para ver até onde o “mentiroso” pode chegar. A cada entrevista, Paul é levado a fazer profundas reflexões sobre a existência humana.

O repórter faz perguntas a Deus sobre livre-arbítrio, salvação, pecado, perdão, céu e inferno. Até chegar à questão fundamental: por que coisas ruins acontecem a pessoas boas?. Ao confrontar o Criador com pressupostos bíblicos, Paul acaba se revelando insatisfeito com a vida, atormentado por antigos traumas.

CRISTIANISMO Entrevista com Deus promete agradar a teólogos e interessados em refletir sobre religião, em especial o cristianismo. Em certos momentos, tenta fugir do didatismo. “Você, mais que todas as pessoas, deveria saber que minhas respostas são confusas”, diz o Todo-poderoso ao jornalista, formado em estudos religiosos.

Porém, ao optar pelo protagonista “que tudo sabe”, o roteiro não escapa da armadilha das verdades absolutas. Questionado pelo incrédulo Paul sobre o porquê de parecer “tão humano”, Deus responde que o homem foi feito à sua imagem e semelhança, repetindo a famosa passagem de Gênesis. Em outro momento, confirma a existência de Satanás, que, acredita, é superestimado. “Ele só tem o poder que você dá a ele”, resume.

O longa acerta ao convidar à reflexão, mas peca ao tentar dar respostas – falíveis, dependendo do ponto de vista. Tabus religiosos como traição e suicídio são colocados em pauta, e a trama sugere superá-los por meio da fé e do perdão. Ao final, a mensagem é que milagres ocorrem diariamente, mas dependem de nossas atitudes. “Às vezes, o milagre é você”, diz Deus a Paul. “Fé não é o objetivo, é o processo.”

Ainda assim, o enredo é atraente e leva a questionamentos oportunos, independentemente da religião do espectador. Estampado em pôsteres e cartazes do filme, o slogan “O que você perguntaria?” soa apropriado e perspicaz.

Ancorado na boa atuação de Strathairn e Thwaites, Entrevista com Deus convida a um papo-cabeça, que, felizmente, não se limita a pressupostos bíblicos.