Testemunhas apontaram existência de organização criminosa formada por agentes do Estado.
Segundo ministro, ideia era desviar as investigações que apuram a morte de vereadora do PSOL
Cerca de oito meses depois do brutal assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do seu motorista, Anderson Gomes, a Polícia Federal vai investigar a suspeita da existência de um esquema criminoso para acobertar a elucidação do caso. O anúncio foi feito nesta quinta-feira pelo ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, que comanda a corporação.
Segundo Jungmann, o requerimento para a instauração do inquérito foi feito pela Procuradoria-Geral da República, a partir do depoimento de duas testemunhas colhidos dentro e fora do Rio de Janeiro. Ele não deu detalhes sobre quem são as testemunhas nem quais os agentes públicos que integraram essa organização criminosa.
Numa entrevista publicada nesta segunda pelo jornal O Globo, o ex-policial Orlando de Oliveira Araújo, conhecido como Orlando Curicica, um dos suspeitos de participar do crime, disse que a Polícia Civil fluminense “não tem interesse” em elucidar as circunstâncias da morte de Marielle. Jungmann não confirmou se Orlando é uma das testemunhas ouvidas pela Procuradoria-Geral da República.
O ministro da Segurança Pública disse que as acusações das duas testemunhas são “graves” e que elas apontaram “nomes” e “valores” dos envolvidos. “Essas denúncias acusam a existência de uma organização criminosa envolvendo agentes públicos de diversos órgãos, milicianos e a contravenção para impedir, obstruir e desviar a elucidação do homicídio de Marielle e Anderson Gomes", afirmou Jungmann, numa coletiva no Ministério da Justiça.
Ele disse ainda que, embora o objetivo principal da PF seja esclarecer a suposta rede criminosa para atrapalhar as investigações, o trabalho da corporação pode sim ajudar a chegar aos autores materiais e intelectuais dos assassinatos. "Se essa investigação levar luz sobre quem matou Marielle e Anderson, é uma possibilidade", pontuou.
Atentado contra a democracia
As investigações do caso Marielle ocorrem a nível estadual, tanto pela Polícia do Rio quanto pelo Ministério Público local. Jungmann disse que, de certa forma, a ação da Polícia Federal será uma "investigação da investigação". Ele lembrou ainda que a Procuradoria do Rio de Janeiro foi contrária à federalização do caso, razão pela qual a Polícia Federal não está apurando diretamente o crime. "Quando a Procuradoria-Geral estava iniciando os estudos para fazer a federalização [das investigações], houve um movimento do Ministério Público do Rio, entendendo que aquilo era uma violação da autonomia do Estado."
Para o ministro, o atentado contra Marielle e Anderson é um crime contra a democracia. "Quando você cala uma representante popular, que defende minorias e leva ao conhecimento denúncias, você está atacando a própria democracia, os direitos humanos e a representação popular", declarou.
Nesta semana, Anielle Franco, irmã da vereadora executada, pediu ajuda para o presidente da França, Emmanuel Macron, para o esclarecimento do crime. Ela participava em Paris da Cúpula Mundial de Defensores de Direitos Humanos e afirmou que, com a vitória de Jair Bolsonaro (PSL), teme que o caso nunca seja esclarecido. Macron disse a jornalistas que aceitou o pedido de ajuda de Franco.