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No Brasil, o absorvente ainda é considerado artigo de luxo. Na ponta do lápis, estima-se que uma mulher gaste entre R$ 3 mil e R$ 8 mil ao longo de sua vida menstrual com absorventes, segundo o relatório Livre Para Menstruar, realizado pelas organizações Girl Up e Herself. Contudo, de acordo com dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a renda anual da parcela mais pobre do Brasil é de R$ 1.920, ou seja, as mulheres que se encontram dentro dessa faixa de renda precisam trabalhar até 4 anos para custear os absorventes que usarão ao longo da vida.
“O absorvente é um item de higiene básico, mas que custa caro. Para muitas pessoas, utilizar um [absorvente] desses é luxo. As mulheres também limitam a vida social, deixam de ir aos lugares com medo de não conter o fluxo sanguíneo. Utilizar um material biológico, como o pão que pode mofar, vai causar infecções. Temos a infecção bacteriana e a infecção fúngica. Esse farelo de pão pode causar doenças dentro da vagina, tendo grandes riscos de desenvolver uma infecção urinária. O sangue também é um material que favorece o crescimento de bactérias e fungos então, esse sangue que fica ali acumulado também pode causar uma maior possibilidade de uma doença genital”, afirmou a ginecologista e professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Márcia de Oliveira Moura.
Apesar do fator biológico, a vulnerabilidade econômica, social e racial também são fortes agravantes durante o desenvolvimento do ciclo hormonal e corporal da mulher -este que compreende da menarca (primeira menstruação) à menopausa, um período médio de 12 a 50 anos. Embora na teoria o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana exista, na prática a realidade é diferente.
Segundo o levantamento Livre Para Menstruar, mais de 1,5 milhão de brasileiras estão submetidas ao mais primário dos problemas relativos ao esgoto, vivendo em casas que sequer possuem um banheiro. Vou te trazer para perto do problema: A comunidade do Pilar, na área central do Recife, é um desses locais. A falta de saneamento é visível, os moradores reclamam a ausência de água, de iluminação pública de qualidade, de equipamentos públicos de lazer para as crianças e, sobretudo, de moradia. Entre as ausências dos mais básicos dos direitos está a falta de banheiros nas casas.
"O processo de higienização indicado é de que, dependendo do fluxo, cada mulher utilize no mínimo quatro absorventes por dia. Além disso, também é recomendado que a mulher faça uma higiene vaginal com água pelo menos duas vezes ao dia, mas a gente sabe que essa não é uma realidade para várias pessoas”, afirmou Márcia.
Um outro relatório, divulgado pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) em 2021, informou que uma família em maior situação de vulnerabilidade e baixa renda tende a dedicar uma fração menor de seu orçamento para itens de higiene menstrual, uma vez que a prioridade é a alimentação.
Ainda segundo o levantamento, a probabilidade de uma menina negra não possuir acesso a banheiros é quase três vezes maior do que a chance de encontrarmos uma menina branca nas mesmas condições. Além disso, enquanto cerca de 24% das meninas brancas residem em locais avaliados como não tendo serviços de esgotamento sanitário, quase 37% das meninas negras sobrevivem nessas condições.
Sistema carcerário
Dentre as tantas violações de Direitos Humanos no sistema penitenciário brasileiro, mais uma: as mulheres privadas de liberdade denunciam a falta ou insuficiência de produtos de higiene menstrual, fazendo com que as reeducandas utilizem materiais -pedaços de roupas, miolo de pão, papelão - que podem causar doenças vaginais na tentativa de estancar o sangue e evitar vazamentos.
Apesar das violações de higiene menstrual serem constantes nos presídios brasileiros, a Seção III da Lei de Execução Penal assegura que a assistência à saúde do preso e do internado de caráter preventivo e curativo compreenderá atendimento médico, farmacêutico e odontológico. No caso das mulheres, a lei também prevê que será assegurado acompanhamento médico à mulher, principalmente no pré-natal e no pós-parto, extensivo ao recém-nascido.
De acordo com Juliana Trevas, integrante do coletivo Liberta Elas, responsável por ações dentro dos presídios femininos de Pernambuco -incluindo arrecadação e distribuição de absorventes- “a urgência da dignidade menstrual se faz necessária em todos os lugares''.
“O kit de higiene básico é político porque existem mulheres que não têm acesso, até por questões financeiras. Quando você é de uma certa classe e tem absorvente todo mês não pensa nisso. Depois de entendermos a situação das mulheres privadas de liberdade, nós compreendemos que sim, é uma questão de respeito e de higiene mínima que foi tirada das presas. A superlotação nas penitenciárias gera violação de direitos. Além disso, existe uma dificuldade em se manter materialmente dentro desses presídios, principalmente quando você não recebe visitas dos familiares para suprir o que o estado não dá. Muitas vezes essas mulheres são deixadas de lado nas políticas públicas de saúde e são lembradas apenas nas políticas públicas de segurança”, explicou.
Em nota, a Secretaria Executiva de Ressocialização (Seres) de Pernambuco informou que existem 1.475 mulheres no sistema prisional do estado, e que “há a distribuição de kits de higiene pessoal com absorventes, priorizando as reeducandas que não recebem visitas”. A Seres também comunicou que as unidades recebem doação de absorventes e kits de higiene pessoal de instituições religiosas, na maioria dos casos. A pasta não informou quantos absorventes cada mulher recebe individualmente.
Rede de doações
Muito antes da criação de políticas públicas, uma rede de assistência para mulheres em situação de vulnerabilidade já atuava em Pernambuco. É o caso da organização Absorvente das Manas, que iniciou o projeto distribuindo absorventes para pessoas em situação de rua e hoje arrecada os itens de higiene menstrual, distribuindo para outras organizações que entregam o material. Entre as parcerias está o coletivo Liberta Elas.
“Eu atuo sozinha e sou responsável pela arrecadação dos absorventes. Tinha pontos de arrecadação espalhados pela cidade, inclusive no Porto Digital. Durante a pandemia houve uma queda no número de doações e, de março até setembro de 2020 não recebemos doações, foi quando precisei fechar os pontos de coleta. Comecei o projeto entregando os absorventes para as mulheres em situação de rua, e aí chegou um pedido de doar para adolescentes que não conseguiam ir para as escolas. Essa é uma demanda muito maior. Foi quando eu entendi que sem políticas públicas nós não conseguiríamos dar conta”, afirmou Alice Gonçalves, criadora do Absorvente das Manas.
Para os interessados em doar absorventes de qualquer tipo ou coletores menstruais, segue a lista de alguns projetos espalhados pelo estado que realizam entregas dos kits de higiene menstrual:
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No Brasil, o absorvente ainda é considerado artigo de luxo. Na ponta do lápis, estima-se que uma mulher gaste entre R$ 3 mil e R$ 8 mil ao longo de sua vida menstrual com absorventes, segundo o relatório Livre Para Menstruar, realizado pelas organizações Girl Up e Herself. Contudo, de acordo com dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a renda anual da parcela mais pobre do Brasil é de R$ 1.920, ou seja, as mulheres que se encontram dentro dessa faixa de renda precisam trabalhar até 4 anos para custear os absorventes que usarão ao longo da vida.
“O absorvente é um item de higiene básico, mas que custa caro. Para muitas pessoas, utilizar um [absorvente] desses é luxo. As mulheres também limitam a vida social, deixam de ir aos lugares com medo de não conter o fluxo sanguíneo. Utilizar um material biológico, como o pão que pode mofar, vai causar infecções. Temos a infecção bacteriana e a infecção fúngica. Esse farelo de pão pode causar doenças dentro da vagina, tendo grandes riscos de desenvolver uma infecção urinária. O sangue também é um material que favorece o crescimento de bactérias e fungos então, esse sangue que fica ali acumulado também pode causar uma maior possibilidade de uma doença genital”, afirmou a ginecologista e professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Márcia de Oliveira Moura.
Apesar do fator biológico, a vulnerabilidade econômica, social e racial também são fortes agravantes durante o desenvolvimento do ciclo hormonal e corporal da mulher -este que compreende da menarca (primeira menstruação) à menopausa, um período médio de 12 a 50 anos. Embora na teoria o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana exista, na prática a realidade é diferente.
Segundo o levantamento Livre Para Menstruar, mais de 1,5 milhão de brasileiras estão submetidas ao mais primário dos problemas relativos ao esgoto, vivendo em casas que sequer possuem um banheiro. Vou te trazer para perto do problema: A comunidade do Pilar, na área central do Recife, é um desses locais. A falta de saneamento é visível, os moradores reclamam a ausência de água, de iluminação pública de qualidade, de equipamentos públicos de lazer para as crianças e, sobretudo, de moradia. Entre as ausências dos mais básicos dos direitos está a falta de banheiros nas casas.
"O processo de higienização indicado é de que, dependendo do fluxo, cada mulher utilize no mínimo quatro absorventes por dia. Além disso, também é recomendado que a mulher faça uma higiene vaginal com água pelo menos duas vezes ao dia, mas a gente sabe que essa não é uma realidade para várias pessoas”, afirmou Márcia.
Um outro relatório, divulgado pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) em 2021, informou que uma família em maior situação de vulnerabilidade e baixa renda tende a dedicar uma fração menor de seu orçamento para itens de higiene menstrual, uma vez que a prioridade é a alimentação.
Ainda segundo o levantamento, a probabilidade de uma menina negra não possuir acesso a banheiros é quase três vezes maior do que a chance de encontrarmos uma menina branca nas mesmas condições. Além disso, enquanto cerca de 24% das meninas brancas residem em locais avaliados como não tendo serviços de esgotamento sanitário, quase 37% das meninas negras sobrevivem nessas condições.
Sistema carcerário
Dentre as tantas violações de Direitos Humanos no sistema penitenciário brasileiro, mais uma: as mulheres privadas de liberdade denunciam a falta ou insuficiência de produtos de higiene menstrual, fazendo com que as reeducandas utilizem materiais -pedaços de roupas, miolo de pão, papelão - que podem causar doenças vaginais na tentativa de estancar o sangue e evitar vazamentos.
Apesar das violações de higiene menstrual serem constantes nos presídios brasileiros, a Seção III da Lei de Execução Penal assegura que a assistência à saúde do preso e do internado de caráter preventivo e curativo compreenderá atendimento médico, farmacêutico e odontológico. No caso das mulheres, a lei também prevê que será assegurado acompanhamento médico à mulher, principalmente no pré-natal e no pós-parto, extensivo ao recém-nascido.
De acordo com Juliana Trevas, integrante do coletivo Liberta Elas, responsável por ações dentro dos presídios femininos de Pernambuco -incluindo arrecadação e distribuição de absorventes- “a urgência da dignidade menstrual se faz necessária em todos os lugares''.
“O kit de higiene básico é político porque existem mulheres que não têm acesso, até por questões financeiras. Quando você é de uma certa classe e tem absorvente todo mês não pensa nisso. Depois de entendermos a situação das mulheres privadas de liberdade, nós compreendemos que sim, é uma questão de respeito e de higiene mínima que foi tirada das presas. A superlotação nas penitenciárias gera violação de direitos. Além disso, existe uma dificuldade em se manter materialmente dentro desses presídios, principalmente quando você não recebe visitas dos familiares para suprir o que o estado não dá. Muitas vezes essas mulheres são deixadas de lado nas políticas públicas de saúde e são lembradas apenas nas políticas públicas de segurança”, explicou.
Em nota, a Secretaria Executiva de Ressocialização (Seres) de Pernambuco informou que existem 1.475 mulheres no sistema prisional do estado, e que “há a distribuição de kits de higiene pessoal com absorventes, priorizando as reeducandas que não recebem visitas”. A Seres também comunicou que as unidades recebem doação de absorventes e kits de higiene pessoal de instituições religiosas, na maioria dos casos. A pasta não informou quantos absorventes cada mulher recebe individualmente.
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Muito antes da criação de políticas públicas, uma rede de assistência para mulheres em situação de vulnerabilidade já atuava em Pernambuco. É o caso da organização Absorvente das Manas, que iniciou o projeto distribuindo absorventes para pessoas em situação de rua e hoje arrecada os itens de higiene menstrual, distribuindo para outras organizações que entregam o material. Entre as parcerias está o coletivo Liberta Elas.
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