Por: Brasil247 - Reportagem de 2013 de Marina Amaral para a Agência Pública revelou que a Mineradora Vale espiona funcionários, movimentos sociais e veículos de comunicação. Na época, o ex-gerente de segurança André Luis Costa de Almeida representou a empresa no Ministério Público Federal; através de emails, planilhas e fotos, ele mostrou que para defender seus interesses a Vale grampeia funcionários e jornalistas; a reportagem é rica em detalhes e evidencia que a espionagem atingiu políticos, jornalistas, movimentos sociais e até Dilma Rousseff quando era ministra das Minas e Energia.
A reportagem começa com uma frase do ex-agente: " Tem que deixar o buraco do rato, não pode encurralar, isso eu aprendi no Exército" . "A frase crua expressa a revolta de André Luis Costa de Almeida, 40 anos, ao explicar por que decidiu revelar o que sabe sobre a área de vigilância e inteligência da Vale S.A, onde trabalhou durante oito anos – nos dois primeiros como terceirizado e depois como funcionário do Departamento de Segurança Empresarial. Ele era responsável pelo serviço de inteligência e gestor de contratos da Vale com empresas terceirizadas da área, quando foi demitido, em março de 2012".
'Eu tentei conversar, mandei e-mails, nada: eles prometeram que não iam me demitir por justa causa, voltaram atrás, depois disseram que manteriam sigilo sobre o assunto mas chamaram meu novo chefe para dizer que minha presença dificultaria a relação comercial dele com a Vale. Tive que sair, não podia prejudicar o cara. Agora eu não me importo com mais nada: só quero que a verdade apareça' ", disse logo no primeiro encontro com a Pública, em meados de maio.
O ex-agente conta que "participava de reuniões, recebia relatórios e era informado formal e informalmente de diversas situações que considero antiéticas, contra as normas internas e/ou ilegais", admitindo que "por pressão sobre o meu emprego, me sujeitei a executá-las", e anexando demonstrativos de notas fiscais que descrevem entre os serviços contratados pela Vale à empresa de inteligência Network, do Rio de Janeiro: a infiltração de agentes em movimentos sociais (no Rio, Espírito Santo, Minas Gerais, Pará e Maranhão); o pagamento de propinas a funcionários públicos (para obter informações de apoio às "investigações internas", na Polícia Federal e em órgãos da Justiça em São Paulo); quebra de sigilo bancário e da Receita (de funcionários, até mesmo diretores), "grampos telefônicos" (entre eles o da jornalista Vera Durão, quando ela trabalhava no jornal Valor Econômico), "dossiês de políticos" (com informações públicas e "outras conseguidas por meios não públicos" sobre políticos e representantes de movimentos sociais).
André contou a história que o levou à Vale depois de 8 anos de exército, convidado por um colega de CPOR, Ricardo Gruba, depois diretor do departamento de Segurança Empresarial: a central de espionagem da Vale, que emprega cerca de 200 funcionários e utiliza quase 4 mil terceirizados (os números foram fornecidos por André, a Vale não disponibiliza a informação). Responsabilizou-se pessoalmente pela instalação de grampos nos telefones de dois funcionários, um deles o gerente-geral de imprensa, Fernando Thompson, e revelou a existência de uma série de dossiês contra lideranças sociais como o advogado Danilo Chammas e o padre Dario, da ONG Justiça dos Trilhos, de Açailândia, Maranhão; o premiado jornalista Lúcio Flávio Pinto, crítico aguerrido da atuação da empresa no Pará; Raimundo Gomes Cruz Neto, sociólogo e agrônomo do Cepasp – Centro de Educação, Pesquisa, Assessoria Sindical e Popular – em Marabá (PA); Charles Trocate, líder do MST, e até da presidente Dilma Roussef, quando ela era ministra das Minas e Energia. "Algumas informações como essas sobre a Dilma eram obtidas através de dados públicos, notícias de jornais, redes sociais, mas outras eram levantadas através de espionagem mesmo, incluindo a dos infiltrados", diz André Almeida.
A reportagem é rica em detalhes sobre a espionagem da Vale e reveladora dos alvos das operações de espionagem no movimento social. O MST ainda é o principal alvo da segurança da Vale, ao lado da rede Justiça nos Trilhos, sediada em Açailândia, no Maranhão, que reúne diversas entidades de direitos humanos em defesa da população atingida pelas atividades do polo exportador. Há mais de 2 anos, a rede trava uma batalha judicial com a Vale contra as obras de ampliação da ferrovia – feitas sem licenciamento ambiental – para escoar a produção em expansão das minas de Carajás, impactando ainda mais a vida das comunidades que vivem no entorno dos trilhos por onde circulam gigantescas composições ferroviárias, de 9 a 12 vezes por dia, cortando reservas ambientais e território indígena e quilombola.