(este artigo foi publicado antes da decisão de Cármen Lúcia, suspendendo a posse)
Michel Temer aguardou Humberto Martins assumir interinamente a presidência do stj para então recorrer da liminar que proibia a posse de Cristiane Brasil no ministério do trabalho.
O juiz Humberto Martins deve possuir predicados especiais, e Temer talvez possua a qualidade de conhecê-los. Por isso programou o momento exato para submeter a ele, e não a outro juiz, a análise do recurso.
A decisão de Humberto Martins, tão célere como o julgamento fura-fila do Lula no TRF4, contrasta com a característica lenta do judiciário no julgamento dos poderosos. E, além disso, chama atenção que a decisão tenha sido apressadamente proferida numa tarde de sábado, 19/1.
A argumentação do presidente do stj consegue ser tudo, menos uma peça jurídica. Humberto Martins argumentou que “O perigo da demora [sic] – grave risco de dano de difícil reparação ou mesmo irreparável – está suficientemente demonstrado pela necessidade de tutela da normalidade econômica, política e social”.
O argumento do juiz é risível e bizarro. O governo usurpador levou o desemprego à casa dos 15%. A urgência nacional é pelo encerramento desta tragédia, não pela sua continuidade e normalidade.
A lei dispensaria Humberto Martins deste blá-blá-blá enganador. A Constituição não proíbe que pessoas com antecedente problemático como Cristiane Brasil assumam cargo ministerial. Bastaria a ele, portanto, justificar objetivamente a decisão, citando o inciso I do artigo 84 da Carta Magna, que trata da competência privativa do presidente da república de “nomear e exonerar Ministros de Estado”. Ponto!
Humberto Martins sabe que o próprio judiciário, cúmplice e legitimador da derrubada fraudulenta da Presidente Dilma, concedeu ilegitimamente a Temer a prerrogativa que é própria de um presidente legítimo, de “nomear e exonerar” ministros. O juiz deveria, por isso, simplesmente amparar sua decisão neste comando, poupando-se de divagações políticas e sociológicas.
Além deste aspecto jurídico, deve-se levar em conta que Cristiane é a própria imagem da cleptocracia que assaltou o poder; ela é uma caricatura perfeita da oligarquia golpista.
A decisão de autorizar a posse dela se ampara no mesmo artigo da Constituição espezinhado por Gilmar Mendes em 18 de março de 2016, quando o juiz tucano proibiu a posse do Lula na Casa Civil do governo Dilma. Na ocasião, Gilmar Mendes e Moro se uniram na caçada ao Lula.
Sérgio Moro divulgou na Rede Globo, com ares de escândalo, conversas telefônicas da Presidente Dilma gravadas ilegalmente. Nos EUA, a pátria que ele reverencia e que dirige estrategicamente a Lava Jato e orienta os procedimentos dele e dos Dalagnóis, ele seria preso e condenado à prisão perpétua por conspiração e alta traição.
Aquele preciso momento, o 18 de março de 2016, foi um momento capital a favor da empreitada golpista. Por isso Moro se expôs à aposta de altíssimo risco, assim como Gilmar.
Hoje, tanto o stj quanto o stf se fazem de mortos em relação ao Gato Angorá [o Moreira Franco], um multi-denunciado que se refugia no foro privilegiado assegurado numa medida provisória escrita sob medida pelo seu comparsa Temer, que o protege no biombo de um cargo ministerial.
Desta vez, contudo, nem Moro nem Gilmar invoca o “desvio de finalidade” na nomeação do Angorá da lista de propina da Odebrecht.
A nomeação de Cristiane Brasil apenas comprova a dupla face do judiciário. Por um lado, o judiciário persegue, caça e condena Lula e o PT. Por outro lado, o judiciário protege os tucanos e o governo de ladrões que tomou de assalto o poder.
Temer agendou a posse da Cristiane Brasil para as 8 horas da manhã de segunda-feira, 22/1, horário raro para cerimônia de posse de autoridades em Brasília. É provável que seja a única vez, em toda a história nacional, incluído aí o período ditatorial, uma posse em horário tão incomum. Por isso será uma posse a portas fechadas, apenas sob o testemunho de corujas sonolentas.
Temer é um precavido. Com a posse clandestina, “temprana” e rápida, ele se antecipa a novas medidas judiciais que possam impedir a posse da filha do Roberto Jefferson quando iniciar o expediente nas repartições judiciais.