JANINE MORAES

Fiquei pasmo ao ler o artigo do Gabeira em que diz que devemos olhar os militares com outros olhos e defende a intervenção militar no Rio.

Gabeira foi um símbolo da luta contra a ditadura militar e contra a caretice da ditadura militar quando parou a praia com sua sunga de crochê.

Como é que pode? Um libertário defendendo ocupação militar da cidade onde ele e milhões de brasileiros moram sob a mira de tanques e metralhadoras.

Não entendo como alguém que sofreu como ele nas mãos dos militares pode dizer uma coisa dessas quando vemos militares fazendo declarações de elogio a torturadores, como vimos o general Mourão fazer outro dia, ao passar à reserva. Ou seja, os militares são os mesmos. Por que devem ser vistos de forma diferente?

É óbvio que a presença militar no primeiro e segundo escalões do governo é a maior desde o final da ditadura.

Em 64, os generais chegaram de uma vez, abruptamente; agora estão ocupando postos-chave aos poucos, de forma lenta, gradual e segura.

A primeira "entrevista" do interventor do Rio foi um exemplo de como ele vê a imprensa e a democracia. Só respondeu perguntas feitas por escrito. Só escolheu para responder as perguntas que quis.

Se coubesse aos militares dirigir os destinos do Brasil a constituição não os impediria de participar de eleições. Talvez a razão mais óbvia seja a de que eles constituem uma organização armada, o que os colocaria em situação de vantagem sobre os demais candidatos.

É um retrocesso inconcebível estarmos aqui discutindo a possibilidade da transformação do regime democrático em mais um período das trevas, depois de todo o sangue, suor e lágrimas que causou aos brasileiros.

Se a sociedade civil não reagir – tal como Gabeira – os militares vão tomar conta do pedaço.