Numa conjuntura em que nossa democracia enfrenta uma situação de beira de abismo, a visita do Premio Nobel da Paz Adolfo Perez Esquivel ao país não poderia ser mais oportuna.
Após três anos de criminalização intensiva, era preciso um olhar protegido pela distância para recordar aos brasileiros e brasileiras a dimensão real de Luiz Inácio Lula da Silva, personagem que, mais uma vez, encontra-se no ponto de passagem no esforço da nação para reencontrar seu destino.
Sabemos que a perseguição judicial permanente não representa apenas uma ameaça a liberdade e aos direitos de Lula. Também vulgariza sua imagem pública. Apequena -- para empregar o vocabulário da ministra do STF Carmen Lucia -- o que fez de melhor, altera os dados da memória coletiva, corroendo verdades que deveriam ser puras e claras como o melhor aço.
Quando o espetáculo tem a cobertura cúmplice dos meios de comunicação, aquilo que é monstruoso parece normal, o inaceitável se torna palatável. O nome disso, sabemos todos, é a banalização do mal, situação típica das ditaduras mais ferozes, aquelas que a humanidade preferia esquecer para não ser obrigada a conviver com pesadelos tão terríveis.
Esquivel veio ao Brasil para nos lembrar disso. Disse que o país está em vias de cometer um crime contra um cidadão que é "referência internacional". Lembrou que Lula não é perseguido por possíveis erros, mas "porque querem reverter o bem que fez às camadas populares". Disse que "o povo está perdendo sua terra, seu teto, seu trabalho". Denunciou a diplomacia dos Estados Unidos, que nunca buscou aliados no Continente, mas apenas estratégias de "dominação". Um dos primeiros a denunciar o golpe que afastou Dilma Rousseff sem crime de responsabilidade, também afirmou que "defender a candidatura Lula é defender a volta da democracia".
Aos 86 anos de idade, militante veterano das lutas democráticas da América do Sul, com gestos afáveis e uma cabeleira de maestro, Esquivel também disse palavras de agradecimento a Lula, 72 anos. Reconheceu o benefício que seu exemplo representa para todos. "É bom ver sua luta incansável pela democracia, pelos povos e pelos direitos humanos", disse. "Dá ânimo para seguir lutando".
Nada do que o Premio Nobel disse ou anunciou chega a ser novidade. Não é disso que se trata. Esquivel veio ao país para agir contra o esquecimento e o conformismo, ajudando os brasileiros e brasileiras de conservar a lembrança das verdades fundamentais de uma época. Esta é a função de um Prêmio Nobel da Paz.