Há diversos equívocos na análise de Denis Lerrer Rosenfield em artigo publicado no GLOBO (“O dia da ira”) segunda-feira sobre o julgamento do recurso de apelação de Lula, dentre eles o de que a defesa do ex-presidente “não se preocupa com argumentos jurídicos, mas tão só com encaminhamentos que têm como finalidade uma maior politização do processo”. O autor se deixou contangiar pela paixão política e, sobretudo, pela desinformação ao fazer tal afirmação, o que contamina todo o raciocínio apresentado.
A verdade é que o nosso foco, como advogados de Lula, sempre foi demonstrar, primeiramente, que as investigações e os processos abertos contra o ex-presidente não observaram as mais basilares garantias fundamentais previstas na Constituição Federal e nos Tratados Internacionais que o Brasil subscreveu e se obrigou a cumprir. E essa demonstração consta em inúmeras peças jurídicas que foram anexadas aos autos desses procedimentos, em recursos e incidentes processuais apresentados perante órgãos judiciais brasileiros e também perante o Comitê de Direitos Humanos da ONU.
Lula foi preso indevidamente (condução coercitiva), sofreu uma devassa indevida, teve sua intimidade brutalmente violada, teve desrespeitado o seu direito de defesa mediante a tramitação de procedimentos sigilosos até mesmo para sua própria equipe de defesa, teve seu direito de defesa cerceado diante da negativa das provas requeridas pelos seus advogados e, sobretudo, foi julgado por um órgão judicial de exceção em Curitiba, sem direito a um julgamento justo e imparcial. Além de sólidos argumentos jurídicos sobre a ocorrência dessas violações, apresentamos provas concretas de que elas ocorreram.
A partir da sentença proferida no caso do tríplex, também demonstramos em um primeiro recurso, dirigido ao próprio juiz de primeiro grau (embargos de declaração), dentre outras coisas, que o caso não tinha qualquer ligação com valores desviados de contratos da Petrobras. Tamanha a força jurídica dos argumentos expostos, que o próprio magistrado, a despeito de sua clara predisposição contra Lula, teve de reconhecer que “jamais” teria afirmado que “valores obtidos pela construtora OAS nos contratos com a Petrobras foram usados para pagamento da vantagem indevida para o ex-presidente”.
Em fase subsequente, no recurso dirigido ao TRF4, que será julgado no próximo dia 24, mostramos que se o próprio juiz de primeiro grau reconheceu a inexistência de recursos da Petrobras dirigidos a Lula, a espinha dorsal da acusação não subsiste. Outrossim, não há na decisão condenatória a indicação de qualquer ato concreto de Lula na condição de presidente da República para beneficiar a construtora OAS, tampouco que ele tenha solicitado ou recebido qualquer vantagem indevida da empreiteira, o que afasta a hipótese de ocorrência de crime de corrupção passiva. Ademais, comprovamos que o apartamento apontado como “vantagem indevida” recebida por Lula foi vinculado em 2011 pela própria OAS em uma operação envolvendo um fundo gerido pela Caixa Econômica Federal, sendo certo que qualquer transferência da propriedade do imóvel pressupõe o pagamento do valor integral em uma conta daquele estabelecimento bancário, o que jamais ocorreu.
Os fatos, portanto, mostram que os fundamentos jurídicos para que seja reconhecida a inocência de Lula foram devidamente apresentados pela sua defesa e que esse é o único resultado possível tecnicamente. Mas a defesa também jamais se furtou a demonstrar o componente político envolvido nesse processo, que faz parte do lawfare deflagrado contra Lula. E o êxito também desse trabalho é o que parece incomodar pessoas que pensam como o Sr. Rosenfield.